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Conversa, terça feira, 14 de julho de 2015

Ontem, de madrugada, na calma do sono, Arturo Paoli partiu para Deus. Arturo era meu amigo e mestre de todos nós na América Latina. Eu o conheci nos anos 60, assim que chegou no Brasil. Era um padre da fraternidade dos irmãozinhos de Jesus (do irmão Carlos de Foucauld). Era um profeta que unia uma grande profundidade teológica, um bom conhecimento de Filosofia e, ao mesmo tempo, uma inserção social e política muito lúcida e concreta.

Viveu com indios na Venezuela. Era época de ditadura e foi expulso de lá. Voltou ao Paraguai. Tempos do Stroesnner. Não pôde ficar. Foi para Novo Hamburgo no Rio Grande do Sul. Enquanto o bispo era Dom Sinésio Bohn, tudo deu certo. Veio outro bispo e ele foi mandado embora. Instalou-se em Foz do Iguaçu, território de fronteiras onde podia assessorar comunidades e grupos no Brasil, no Paraguai e na Argentina. Nos anos 80, várias vezes, fui lá para ajudá-lo na sua comunidade. Quando eu coordenava a comunidade de Goiás, alguns irmãos da comunidade passavam tempos com ele em Foz e algumas pessoas de sua comunidade vinham passar conosco em Goiás.

Artur era um homem profundamente evangélico. Uma vez lhe perguntei como ele orava. Ele me respondeu com toda sua sinceridade: "Há anos que não faço propriamente oração. Sinto que estou nele e ele em mim". E eu saí da conversa com inveja dele porque eu para poder dizer o mesmo (estar em Deus), precisava de fórmulas e ritos que ele já não precisava.

Nos últimos anos, já muito idoso e cansado, voltou definitivamente à Itália. Quando completou 100 anos, me pediu que o ajudasse a celebrar. Fizemos um ato ecumênico sobre os 50 anos do Concílio Vaticano II e 100 anos de Arturo. Ele falou de modo inflamado e muito lúcido. Foi a última vez que o vi falar em público. Nesse ano, em maio, estive em Lucca e o visitei. Ele estava em uma cadeira de rodas e o senti lúcido, mas muito diminuído no peso dos seus 103 anos.

Agora sei que partiu em paz e feliz para Deus. Ver o seu rosto sempre irradiava paz e alegria interior. Um sorriso de santo. Que no céu ele nos fortaleça e nos estimule no caminho da profecia que ele viveu. 

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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