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Conversa, terça feira, 24 de julho 2012

Queridos irmãos e irmãs, 

Cheguei em São Paulo para o curso de ecumenismo. Até 5a feira, devo desenvolver o tema que me pediram: "Terra e humanidade, solo sagrado das religiões". No começo, achei o tema impostado de forma estranha e perguntei: O que vocês querem mesmo? um curso sobre espiritualidade ecológica? Depois compreendi: os alunos, vindos de várias regiões do Brasil e de outros países da América Latina pertencem a Igrejas diferentes e um ou outro são membros do Candomblé e de tradições indígenas latino-americanos. Eles tiveram quase dois meses de curso sobre as diversas religiões e como compreendê-las e dialogar com elas a partir da fé cristã. Agora comigo o desafio é compreender que a religião é como um idioma amoroso. Tem o vocabulário, mas o conteúdo do que se diz é dado por quem fala. A religião é do plano dos símbolos ou como dizem os cristãos: do sacramento. O templo e o sagrado existem para lembrar que a terra inteira é sagrada. O santuário não é sagrado em si mesmo ou de forma isolada. É referente à sacralidade da terra e de todo o universo. Do mesmo modo, os sacerdotes, pastores, gurus e chefes das religiões não são pessoas mais sagradas do que qualquer outra. Consagram-se sim a revelar que toda pessoa humana e até todo ser vivo tem sua sacralidade e merece respeito e veneração. A dificuldade é que desde o tempo mais antigo, a Bíblia diz que desde quando o rei Davi quis edificar um templo para Deus (Cf. 2 Samuel 7), os reis e sacerdotes tendem a se apoderar do templo como forma de controle do povo. É através do templo que bispos, pastores e outras autoridades religiosas têm o seu poder garantido. Então, fazem do templo algo sagrado em si mesmo, sagrado no sentido de separado do mundo que é profano. Temos de restaurar a dignidade sagrada de tudo o que é humano e terreno. Nesse sentido, nesse curso de ecumenismo, a minha tarefa vai além de ensinar o diálogo entre Igrejas e entre religiões. É o diálogo com a vida e com todas as dimensões da natureza e do ser. 

Hoje fiz o prefácio de um livro do psicanalista Patrick Oliveira. Eu o conheci quase menino e o recebi como postulante no mosteiro de Goiás. Ali o orientei e quando ele, negro, manifestou o desejo de conhecer a religião dos Orixás, religião de seus antepassados, eu o aproximei de Mãe Stella e do Candomblé Opô Afonjá. Quando ele decidiu sair do mosteiro, o apoiei e continuei acompanhando-o. Mora em Goiânia e formou-se em Psiquiatria. Publica agora o livro "Aperte o Mute" (Crônicas da cotidianidade). Pediu-me um prefácio e eu o fiz. Para isso tive de correr e ler o livro inteiro. Mais de 40 crônicas, algumas pequenas e outras mais longas. Sobre uma abrangência imensa de assuntos, desde a experiência do acompanhamento de pessoas até fenômenos como a reforma psiquiátrica, o problema das drogas, a oficialização da união gay, quando a negritude e a homossexualidade se juntam e vários outros temas. Independentemente de concordar com todas as suas idéias, essas crônicas nos fazem pensar e descobrir justamente a sacralidade da vida e como só pela restauração da dignidade humana e de todo ser vivo podemos construir um mundo novo mais justo e amoroso. 

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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