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Meditação bíblica, domingo, 20 de julho 2014

O evangelho proclamado hoje nas missas e cultos é a parábola do joio e do trigo. Jesus conta a parábola e logo depois a comunidade põe na boca de Jesus uma interpretação de tipo alegórica (vers. 24- 30 e 36 - 42). 

Jesus deve ter contado cada uma dessas histórias do capítulo 13 de Mateus em um contexto próprio. O evangelho juntou-as num só capítulo. Por isso, hoje, não sabemos exatamente a que fato ou situação essa história se referia no momento em que Jesus a disse pela primeira vez. Possivelmente era ainda uma realidade de crise na qual ele tinha de se explicar porque havia anunciado a chegada imediata do reinado divino e isso não tinha ocorrido.

A parábola do joio e do trigo parece ser a única do evangelho, da qual o próprio Jesus dá uma explicação apocalíptica. É ele mesmo quem diz: “esperem o final dos tempos. Só então, os injustos serão separados das pessoas justas”. Este tipo de leitura me parece perigosa e até falsa. Além de comparar Deus com um fazendeiro rico que tem servos (escravos) e também de dizer que Deus castiga os maus com o fogo eterno (será que aceitamos dizer isso de Deus hoje em dia?), essa parábola é das que mais separam as pessoas em boas e más. É claro que nós que ouvimos o evangelho e nos sentimos cristãos nos situamos do lado das pessoas boas. Nós seríamos o trigo e os descrentes seriam o joio. É claro que isso vem da interpretação literal ou fundamentalista da parábola. Neste modo de entender, Jesus teria dito que o reino dos céus é comparado ao trigo e o diabo é quem semeou o joio. Certamente as próprias Igrejas dos primeiros séculos (como Mateus) interpretaram assim. Mas, é possível que esta não tenha sido a palavra original de Jesus. Como já  afirmei, possivelmente, Jesus contou essas parábolas em um momento de crise pessoal. Sentia-se incompreendido e rejeitado e estava criticando o sistema político e religioso do seu tempo. Ele tenta explicar ao povo e aos discípulos porque tinha anunciado o reino e, afinal, aparentemente nada tinha mudado. O reinado divino não tinha chegado ainda, como as pessoas cobravam dele. Se o contexto era esse, o fazendeiro que planta o trigo significa o sistema. Se fôssemos nós também fazer alegoria, o fazendeiro não seria Deus. Seria o império romano e todo império do mundo.  E, ao contrário, da interpretação comum da parábola, o reinado divino é justamente o adversário do império ou do sistema. É o tal inimigo que vem e joga no campo a erva daninha. E ninguém pode contra ela. Não adianta tirar o joio logo, porque como este é venenoso, contaminaria o trigo inteiro. Só no tempo da colheita é que se pode separar. Então, se é assim, Jesus está dizendo que o reino vem mesmo e que ninguém pode fazer nada contra ele. 

 A comunidade do evangelho leu isso como se Jesus tivesse insistido na tolerância e na paciência. Tudo bem. É normal que o mesmo texto vá recebendo diversas interpretações no decorrer dos tempos. Aqui se encontra sim a tolerância de Jesus e o fato de que trigo e erva má devem conviver até o final dos tempos. De fato, o reinado divino se desenvolve no meio das ambiguidade da vida e da história. A erva daninha só é tirada e separada do trigo na época da colheita.  

Aliás, Jesus fez várias comparações assim que hoje chamaríamos de “politicamente incorretas” para a época. Por exemplo, comparar o reino dos céus com um ladrão que assalta uma casa (Mt 24, 43) ou ainda com um gerente desonesto (Lc 16) ou com um empregador que paga aos lavradores que trabalharam só uma hora igual aos que trabalharam o dia inteiro (Mt 20, 2 ss). O reinado divino subverte sempre os esquemas e o modo de ser do mundo.

Na realidade atual em que vivemos, isso nos traz esperança e força para continuar lutando e acreditando. 

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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