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Meditação bíblica, domingo, 23 de março 2014

Neste 3° domingo da Quaresma, desde muito antigamente, as Igrejas proclamam o evangelho do encontro de Jesus com a mulher samaritana (Jo 4). Além de ser uma página belíssima do evangelho, é uma das mais antigas catequeses catecumenais da Igreja. Justamente, os cristãos dos séculos antigos usavam esse evangelho nesse domingo porque era o dia em que, entre os candidatos ao batismo, se escolhiam aqueles/as que iriam ser batizados na noite da Páscoa e, nesse domingo, eles passavam pelo que se chamava o primeiro escrutínio ou diálogo da fé. E aí a conversa de Jesus com a samaritana era um bom modelo do cristão que deseja "Dá me sempre dessa água viva". 

Quando a gente conhece a terra de Israel, principalmente a Judeia e Samaria, assim como o sertão nordestino, compreende a importância da água. A água é elemento essencial da vida e da liberdade de um povo. No mundo antigo, conquistava liderança e se tornava chefe quem garantisse água para o seu povo. Hoje, no século XXI, vários conflitos internacionais são, entre outros motivos, por causa da água (judeus e palestinos brigam pelo controle do rio Jordão, egípcios e etíopes pelo Nilo e entre outros povos da África vários conflitos pelo uso de rios.) 

É uma feliz coincidência que tendo sido ontem (22) o dia internacional da água (estabelecido pela ONU), hoje o evangelho seja esse. A água viva é sacramento do Espírito.

Para mim que trabalho no diálogo interreligioso, esse evangelho é um verdadeiro esboço ou esquema de como deve ser o diálogo. 

1 - Jesus toma a iniciativa - nem sempre temos coragem disso. 

 2 - Inicia o diálogo reconhecendo que se precisa do outro - Jesus pede algo à mulher. 

3 - Parte da vida e da realidade do outro (no caso, dela).

4 - Jesus a aceita e a trata com dignidade, mesmo depois que fica claro que ela teve cinco maridos e agora vive com um homem estranho. 

5 - No diálogo, devemos assumir nossa identidade - o diálogo não é uma capitulação da sua fé, nem confusão. Jesus diz claro: a salvação vem dos judeus; 

6- Mas aponta para um encontro novo e diferente. "Nem nesse monte, nem em Jerusalém. Deus é espírito e verdade e deve ser adorado em espírito e verdade".

Esse evangelho mostra a mulher samaritana como símbolo do seu povo e no caso de todas as pessoas tidas como hereges e discriminadas por seu modo de crer. São tantos no mundo de hoje. 

Jesus a acolhe e aceita ser samaritano com ela. Rompe com toda a carga de preconceitos que os judeus tinham. O Talmud diz que é mais impuro conversar com uma samaritana do que comer carne de porco. Quanta gente hoje se mantém assim, presa aos preconceitos religiosos. O papa Francisco nos chama a sujar as mãos. Eu prefiro uma Igreja suja de lama no meio dos pobres do mundo do que limpa e protegida nos seus espaços afastados do mundo. 

É Jesus que rompe com o costume judaico e está na Samaria. É ele que se aproxima da mulher (uma mulher tão marginalizada que no lugar de vir ao poço de manhã cedo, na hora na qual todo mundo vem, ela só pode vir ao meio dia, hora em que ninguém vem), E estabelece com a mulher um diálogo que começa desencontrado e termina lhe dando a fé. Em um lugar que não tem água e só tem um único poço, ele promete água viva (água corrente de fonte). A mulher se espanta e diante disso, ele se revela Salvador e Messias (Consagrado de Deus). Medito esse evangelho e peço a Deus a graça de retomar essa sede de Deus que Jesus pede e peço ainda a grande (imensa) graça de que a celebração dessa nova Páscoa seja para mim ocasião e sacramento de revivificar em mim essa sede. Que ao contrário de quem beber não precise mais buscar o poço, quero bebendo ficar com mais e mais sede uma sede insaciável até mergulhar no poço que é o próprio mistério do amor divino. 

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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