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​Meditação bíblica, para o domingo 06 de outubro 2013

Meditação para o 27º Domingo do Tempo comum – Ano A

Confiança em meio à crise

Atualmente, é comum encontrarmos pessoas decepcionadas com relação à política e ao modelo de sociedade dominante no mundo. Mesmo cristãos engajados nos movimentos sociais expressam certa falta de esperança no futuro. A crise não afeta só a segurança social e econômica a qual todos têm direito. Põe dúvidas sobre o futuro da vida no planeta Terra. Aos cristãos e outros crentes, a crise também é de fé. Questiona sobre a relação entre as promessas divinas e a possibilidade de um mundo novo, mais justo e humano.

Conforme o texto do Evangelho que as comunidades católicas e de outras Igrejas escutam nesse domingo (Lc 17, 5- 10), Jesus está em meio à viagem a Jerusalém onde seria preso e morto. Ele tinha anunciado que o reinado divino se realizaria nesse mundo. Até garantiu que algumas das pessoas que o escutavam não morreriam “sem ter visto chegar o reino de Deus” (Cf. Lc 8, 27 e Mc 9, 1). No entanto, a promessa pareceu não acontecer como as pessoas esperavam. O próprio Jesus parece ter vivido essa crise e partiu em peregrinação para a Páscoa em Jerusalém. O contexto era de crise. Por causa da dificuldade de perseverar na fé em meio à crise, os apóstolos pedem a Jesus “aumenta-nos a fé”. Não se trata apenas de aumentar o tamanho da fé e sim a sua qualidade, o teor do nosso crer. Hoje, a dificuldade não é crer, mas em que se crê. Jesus responde com uma comparação de sabor semítico que parece exagero: se tiverdes um pouco de fé podereis desenraizar uma árvore enorme e transportá-la ao mar. É uma imagem para dizer que a confiança (aman) na promessa de Deus nos dá uma força incalculável.  E essa conversa faz Jesus contar a parábola do patrão e do empregado.

Naquela época, não existiam direitos trabalhistas. Os patrões se sentiam com o direito de exigir do empregado tudo o que pensavam precisar. Até hoje, em regiões do Brasil e do mundo, patrões se comportam como proprietários absolutos dos seus empregados. Jesus não justifica nem sacraliza isso. Ele apenas afirma: do mesmo modo que, nesse tipo de sociedade, ao agirem do modo que os patrões exigem, os empregados não se sentem fazendo mais do que sua obrigação, assim também os discípulos e discípulas do reino devem considerar-se simples servidores/as e não com direitos diante de Deus.

Hoje, não podemos interpretar essa palavra literalmente. Seria injusto com os empregados. Nela, Deus é comparado com um patrão insensível e opressor. É preciso ir além do texto. Jesus o chamou de “paizinho” e nunca quis que pensássemos na divindade como um patrão opressor. O que ele pede dos discípulos é a confiança, mesmo no meio da crise. Hannah Arendt, a filósofa judia que aprofundou o seu pensamento a partir da realidade do nazismo, afirmou: “O ser humano é o único ser capaz de fazer de si mesmo um milagre”. “Esse milagre é sempre ser capaz de recomeçar”. Mas, o novo início é confiado ao ser novo e não como indivíduo e sim à pluralidade das pessoas. Cada ser humano só se torna livre saindo do seu isolamento no ser com os oturos, no espaço público da política...”[1] Crer na palavra de Jesus é crer no projeto divino que, diariamente os cristãos pedem ao orar: “Venha a nós o teu reino”. E crer é colaborar para que ele aconteça em um projeto novo de sociedade.

[1] - Cf.  ROBERTO VINCO, Sono stata pensata, quindi sono – Il pensiero político de Hannah Arendt, Rimini, Ed. Pazzini, 2012, p. 14. 

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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