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​Meditação bíblica, sábado e domingo, 12 de maio 2013

Nesse domingo, as Igrejas antigas celebram (no Brasil e em alguns países) a festa da Ascensão de Jesus. Ascensão é o termo para expressar o que os evangelhos e o livro dos Atos dos Apóstolos (1a leitura desse domingo) contam que ele (Jesus) subiu ao céu. Desde criança me habituei a imaginar a cena espacialmente. Hoje sei que o céu é o projeto divino no mundo e a realidade de Deus que é dentro de nós e de forma misteriosa, mas ao menos em termo de espaço, nem fica em cima (nas nuvens), nem em algum planeta que a humanidade ainda não colonizou.  Então, no lugar de usar essa imagem (é uma imagem) da subida, hoje prefiro dizer que a pessoa de Jesus ressuscitado foi assumido por e em Deus. 

Nesse ano (se chama C), o evangelho proclamado é de Lucas. Esse evangelho concentra todos os relatos sobre a ressurreição de Jesus não como tendo ocorrido em 40 dias (como faz o livro dos Atos) e sim no tempo de um único dia, o domingo. Enquanto nos Atos dos Apóstolos, ele dirá que o Ressuscitado passou 40 dias aparecendo aos seus antes de subir ao céu, aqui a ascensão é no mesmo primeiro dia da semana. É como um único domingo, tempo novo que se estende da madrugada da ressurreição até a manifestação da vinda de Deus. Um dia imenso e duradouro no qual nós todos vivemos e do qual somos todos contemporâneos. 

 O evangelho diz que Jesus é elevado ao céu. O verbo no passivo indica a ação divina. É Deus que eleva Jesus, ou melhor, que o assume em sua intimidade e na plenitude do seu reinado. A “elevação” é uma forma espacial para dizer isso na cultura do tempo. Não quer dizer que ele se afastou dos discípulos e discípulas e sim que ele não se deixou mais ver, como antes. Então não é que ele partiu e sim que não se deixou mais ver. Tornou-se invisível. Quando eu era jovem, adorava esses filmes sobre "o homem invisível" e eu mesmo imaginava como seria estar presente sem ser visto. Ao viver isso, me parece que Jesus escolhe uma forma de estar conosco, estar em nós e ao mesmo tempo não interferir, respeitar a autonomia do humano. Não interfere, mas inspira e apoia. É importante observar que, conforme o evangelho de Lucas, ele, Jesus, se torna invisível à medida que os abençoa. E o texto da comunidade de Lucas finaliza insistindo nos grandes temas do seu evangelho:

1- a permanência em Jerusalém, símbolo da presença divina para o povo antigo. (O Evangelho de Lucas começa e termina no templo). Para nós isso significa manter-se em comunhão. Não se isolar. 

2- a alegria messiânica, uma alegria imensa e profunda que só pode vir da fé. No quarto evangelho, Jesus dirá: “E eu de ver vocês de novo e, então, a tristeza de vocês se converterá em alegria e uma alegria tão grande que ninguém poderá tirar de vocês”. Quando conta que, na tarde do domingo, Jesus ressuscitado se deixa ver pelos discípulos e discípulas reunidos (Jo 20, 19 ss), assim como Lucas, diz que “eles (elas) ficaram imensamente alegres, ao verem o Senhor” (Jo 20, 20). Essa alegria deve acompanhar sempre nossa missão. Mesmo no meio do sofrimento, das dores e do martírio, essa alegria, dom do Espírito, deveria se constituir a característica do testemunho da ressurreição. Como, às vezes, por educação, me sinto sério demais, peço a Deus que me dê esse dom da alegria interior e da leveza. 

3 – o louvor de Deus. Os Atos dos Apóstolos insistirão muito nessa permanência diária no templo, bendizendo a Deus. Hoje, o nosso templo é o universo, é a vida cotidiana. O templo de Deus é onde nós estamos, seja onde for. Bendizer a Deus é dizer bem da vida, é festejá-la e referi-la ao Espírito. É proclamar que todas as criaturas testemunham sua presença e o seu amor fiel. E lembrar essa presença libertadora na nossa história, na história da nossa fé e na promessa divina que se realiza em nossos dias e ainda se cumprirá até que Deus seja tudo em tudo (todos e todas).

4 – A missão. Ficar em Jerusalém no contexto deste evangelho significa a obediência ao que Jesus ressuscitado tinha dito: “Vocês serão testemunhas disso. Eu envio a vocês aquele que o Pai prometeu. Fiquem na cidade até serem revestidos com a força vinda do céu” (Lc 24, 48- 49). Então, o permanecer em Jerusalém para receber o Espírito é em função do envio, isto é, da missão de ser testemunhas “disso”. De que? Da ressurreição, do perdão que Deus dá à humanidade e da vinda do reinado divino sobre a terra. Essa missão, a gente pode hoje compreender como o envio para testemunhar o projeto divino no mundo e dar a nossa vida para que esse projeto de justiça e paz se realizem. 

5 – A inserção na realidade social e política do mundo.

No tempo da comunidade de Lucas, muita gente das comunidades pensavam que a vinda definitiva de Jesus, como ele tinha prometido, seria imediata e muito próxima. O tempo passava e isso não acontecia. O evangelho de Lucas deixa claro que ele vem, mas não já. Onde Marcos tinha dito que, durante a paixão, Jesus tinha prometido aos que o escutavam: “Vereis o Filho do Homem vir sobre as nuvens do céu” (Mc 14, 62), Lucas, quando conta o mesmo fato, diz apenas: “Vereis o Filho do Homem sentado à direita do poder de Deus” (Lc 22, 69). O fato de Jesus ter ressuscitado e estar na glória do Pai não nos tira da História. Ao contrário, nos faz testemunhas disso no meio do mundo e na inserção concreta aqui e agora.  Temos de ser testemunhas do projeto divino acontecendo no mundo em meio aos fatos e situações da nossa história concreta. Temos de nos interessar sim pela política, pelos movimentos populares, pelo processo bolivariano que está emergente na América Latina. Temos de ser cidadãos desse mundo no testemunho do projeto divino. 

E para isso contamos com a força do Espírito, Mãe de amor, sopro benfazejo da ternura divina em nós e conosco. 

Para você que está lendo essas linhas uma boa celebração desse domingo e não esqueça: essa semana que começa com esse domingo é no hemisfério sul a semana de orações pela unidade dos cristãos. Fico feliz em saber que em várias cidades, as Igrejas cristãs ligadas ao ecumenismo realizarão várias atividades, fóruns e encontros de oração. Assim, nos prepararemos melhor para festejar no próximo domingo a festa de Pentecostes, atualização da vinda do Espírito Santo em nós e no mundo. 

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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