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Batismo de Jesus: escola de profecia

Batismo de Jesus, escola de profecia

                 Neste domingo, as Igrejas antigas celebram a festa do Batismo do Senhor. Esta celebração, ainda ligada à festa da Epifania, encerra o ciclo litúrgico do Natal. Assim, amanhã a Igreja passa a celebrar o que se chama “tempo comum do ano”. Todos os quatro evangelhos concordam que a missão pública de Jesus se inicia com o seu batismo. Hoje lemos a versão de Mateus (Mt 3, 13- 17). Conforme esses relatos, o fato de ter sido batizado (mergulhado) por João no rio Jordão é o que dá a Jesus a sua vocação profética. Isso significa que ele não é um impostor e sua autoridade de profeta lhe permite falar em nome de Deus. Mateus conta que Jesus veio da Galileia para receber o batismo.  Ao dizer que foi de João Batista que Jesus recebeu o batismo, o evangelho revela que João foi o mestre de Jesus. Foi com João Batista que Jesus aprendeu a ser profeta. João ensinou a Jesus o que Deus quer dizer ao mundo e mostrou a importância de Jesus ter coragem de dizê-lo, mesmo se isso contraria o poder político e principalmente o religioso. 

Para nós, isso revela uma forma própria de olhar a missão. A vinda do projeto de Deus ao mundo (o reinado divino) é anterior à missão de Jesus. Conforme Mateus, não é Jesus quem inaugura o reino. Assim que João é apresentado pelo evangelho, proclama: “Mudem de vida (se convertam), pois o Reino dos céus está próximo” (Mt 3, 2). (Nos outros evangelhos, só Jesus diz isso e não João. Em Mateus é João que diz. Mais tarde, Jesus só repetirá o que João já tinha dito. Ver Mt 4, 17). É uma perspectiva teológica inovadora: João não é simplesmente o “precursor” de Jesus. Não é só um preparador. Ele é o profeta que anuncia que a realização do projeto divino no mundo e faz de Jesus um profeta para nós. Jesus anuncia o reino porque já o recebeu. Ele o descobre presente no mundo, nos acontecimentos da vida e nas pessoas. Jesus descobre o projeto divino acontecendo no mundo com os olhos de João Batista, com os olhos de um  profeta, de todos os profetas. 

Que maravilha! O Reino dos céus sempre esteve presente, misturado com a história do povo. Os profetas o souberam enxergar, apontar, realizar. Então, para nós, um modo bom de celebrar hoje o batismo de Jesus é aprender a descobrir e a testemunhar o reino de Deus presente no mundo, independente de religião e da Igreja. Diferentemente da visão de Paulo de que com a vinda de Jesus, os cristãos serão arrebatados ao céu, na visão do batismo de Jesus é o céu que desce à terra, o Espírito que se une ao ser humano e começamos assim um mundo novo. 

João Batista faz isso mais através de um rito simbólico, o batismo do que simplesmente de uma pregação. Batismo é o termo grego para mergulho, inserção. No tempo de Jesus, o mergulho nas águas do rio Jordão, proposto e coordenado pelo profeta João, era símbolo de purificação e de banho regenerador para uma vida nova. Para nós, a noção de pecado é moral. Naquela cultura, o pecado era social e cultural. Era viver uma situação que afastava a pessoa do templo e da pureza ritual. Pecadores eram os trabalhadores pobres que dependiam dos estrangeiros ricos para sobreviver. Eram as mulheres que ficavam impuras quando menstruavam e quando davam a luz. Eram as pessoas que abatiam animais para vender... Isso significa que eram os pobres marginalizados. Batismo para perdão dos pecados era para libertação das marginalizações que, em nome de Deus, deixavam os pobres fora da fé. 

A celebração do batismo de Jesus nos confirma que adianta a gente inserir-se nos movimentos sociais e grupos de base. Vale a pena passar pelo mesmo caminho de Jesus, ser discípulo de João, o profeta. Como João e Jesus, mergulhar (batismo é mergulho) na vida dos marginalizados para apontar que Deus está do lado deles e, assim, ser testemunhas da ressurreição de Jesus, através do sacramento do batismo cristão. 

Hoje, no mundo, profetas e profetizas do reino de Deus como foi João Batista são todas as pessoas que ajudam as pessoas e grupos de base a manter a esperança e ainda acreditar na possibilidade do novo que vem. É essa missão que faz o que, simbolicamente, o evangelho conta na cena do batismo de Jesus: os céus se abriram para dizer que, a partir de então, não dá mais para dividir céu e terra, fé e política, espiritualidade e compromisso libertador. Quem vive isso, escuta hoje no seu coração a palavra de Deus que retoma a profecia de Isaías:  “Este é o meu filho, a minha filha, em quem ponho toda a minha afeição”

 

 

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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