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​Comentário de filmes, quinta feira, 18 de outubro 2012

Vale a pena rever: A Festa de Babette (de Gabriel Axel)

Alguém pode pensar que uma coisa nada tem a ver com a outra, mas, seja como for, cada vez que vivemos período eleitoral e nesses dias em que várias cidades brasileiras preparam o segundo turno das eleições municipais, eu me lembro especialmente do filme“A Festa de Babette”, obra prima dirigida por Gabriel Axel e que merece ser visto e revisto.

Não direi imediatamente a razão pela qual associo o filme ao que o Brasil vive nestes dias. Antes de tudo para deixar que cada leitor tire suas conclusões, mas também para não roubar ao espectador o prazer de descobrir a história vendo o filme e não lendo esta crônica. É claro que, para tanto, é necessário ter visto e, agora, se possível, rever o filme. É uma obra prima, feita em 1987 e se inscreve na grande tradição dos filmes europeus que vêm do neo-realismo italiano, da nouvelle vague francesa, do cinema-novo brasileiro e de outros movimentos que querem ligar o Cinema à realidade. Ao fazer isso, estes filmes conseguem falar ao mundo inteiro uma mensagem de renovação e esperança.

A história, baseada em um livro do grande escritor Isak Danesen,  se passa no final do século XIX. Gira em torno de uma pequena comunidade luterana situada no litoral da Dinamarca. A fotografia, em luz quase preto e branco, pela própria lentidão e monotonia cromática, revela o dia a dia imutável e pesado da comunidade. Depois da morte do velho pastor que durante anos coordenara a comunidade, este ministério de coordenação é agora assegurado pelas duas filhas do pastor. Martina e Philippa são duas irmãs solteironas, cada uma com sua história de repressões e de amores frustrados. Elas contam com a ajuda de Babette, uma francesa que em 1871, quando as duas irmãs eram crianças, se refugiou na comunidade fugindo da Comuna de Paris e agora lhes serve de ama e coordenadora da casa. De repente, Babette descobre que ganhou um grande prêmio de loteria na França e decide realizar a grande festa que dá nome ao filme. Mais do que isso, não direi, mas chamo a atenção para o conflito profundo entre a tradição dogmática e doutrinária que sempre dominou a comunidade e a boa notícia de uma festa que, mesmo aos que não querem aceitá-la, alegra e renova. É bom lembrar que, no grego, o termo evangelho significa boa notícia. Hoje, para alguns grupos cristãos e mesmo católicos, a fé parece mais uma expressão da lei e dos costumes que a tradição convencionou considerar cristãos do que propriamente uma notícia de amor e liberdade como anúncio do reino de Deus que Jesus trouxe ao mundo. As notícias opunham em São Paulo um candidato "evangélico" apoiado pelas Igrejas neo-pentecostais e o fato de alguns líderes da Igreja Católica ter se pronunciado a favor de um candidato "católico" para que o neopentecostal não vencesse. Graças a Deus, nenhum dos dois foi para o 2o turno. Mas, os dois que estão disputando para ver quem será o prefeito de São Paulo continuam discutindo cartilhas contra homofobia e outros temas afins, no lugar de programas que pensam para a cidade.  

Infelizmente, parece que nenhum dos dois candidatos representa uma proposta profunda de transformação social e política. Entretanto, seja como for, esperamos que, na atual realidade brasileira, como no grande filme de Axel, a esperança sempre vença o medo e o amor supere o ódio. No filme "A festa de Babette", fica claro como coisas tão simples como o comer e o conviver podem servir para o desabrochar da alma e ajudar as pessoas a viverem a liberdade de filhos de Deus e a descoberta de que a fé não pode ser contrária à alegria e à festa.

  A Festa de Babette está em DVD e vocês o encontram nas boas videotecas do ramo e na internet. Aproveitem. 

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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