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Meditação bíblica, domingo, 30 de outubro 2016

O encontro com Zaqueu (Lc 19, 1 – 10). 

O encontro com Zaqueu é o último episódio que Jesus vive antes de chegar em Jerusalém. Jericó é uma cidade de fronteira, passo obrigatório para os peregrinos que vêm do norte através da Peréia. Por este fato, é um posto comercial importante. Daí que se compreende a importância na cidade do posto de alfândega e da cobrança dos impostos. Zaqueu enriqueceu neste trabalho. Ele é cobrador de impostos a serviço dos romanos, isto é, alguém odiado pelo povo. Com seu contato com os romanos e o pouco escrúpulo com o qual tem de cobrar os impostos do povo pobre, é um homem considerado pecador e mesmo desonesto. Além disso, o evangelho realça que é rico. 

Zaqueu é rico em termos de que possui riquezas, mas não é chamado de archon, “importante”. Por ser publicano, cobrador de impostos, não é aceito como elite na cidade. A riqueza e a pobreza não são categorias apenas econômicas. São também sociais e políticas. Zaqueu é rico, mas não é respeitado socialmente. É quase um caso desesperador. No capítulo anterior, Lucas tinha mostrado Jesus dizendo que é muito difícil, quase impossível um rico ser salvo (Cf. 18, 24- 25). Mas, para Deus, nada é impossível. 

A comunidade de Lucas conta o caso com certo toque de simpatia, quase de humor. Zaqueu quer ver Jesus e usa a estratégia de subir em uma árvore. É difícil imaginar um homem importante da cidade, um rico, subir em uma árvore para ver alguém que passa. Mas, Zaqueu faz isso. Essa renúncia a uma postura de prestígio e poder já faz parte do processo de conversão. Ele sabe que não é fácil ele aproximar-se de Jesus. Pertence a uma categoria de pessoas odiadas pelos judeus e considerado pecador pelos religiosos. E Jesus é um mestre espiritual. 

O relato não insiste nos elementos psicológicos. Simplesmente conta o processo de uma conversão. No começo, ele quer ver Jesus. Aparentemente, por curiosidade, já que não pensa em se aproximar. Quer só vê-lo. Nos evangelhos, talvez seja o único caso de alguém que se aproxima de Jesus assim, gratuitamente, só para ver, para conhecê-lo. Zaqueu não sabe bem o que quer de Jesus e nem o que Jesus quereria dele. Simplesmente se abre ao mistério. Uma coisa importante para todos nós, em todos os momentos da vida. No caso de Zaqueu, como também no nosso, é Jesus que toma a iniciativa do contato. Sai da estrada, vai até onde ele estava sobre a árvore e diz: “Zaqueu, desça depressa que eu quero ficar em sua casa”. 

O evangelho diz “é preciso”. É uma expressão usada nos evangelhos para dizer que algo está no projeto divino. Várias passagens do evangelho dizem que tal fato se cumpriu “para que se cumprisse o que estava anunciado pelos profetas”. Depois da paixão, segundo Lucas, Jesus dirá aos discípulos: “era preciso que o Cristo sofresse para poder entrar na sua glória” (Lc 24, 26). 

Jesus entra na vida de Zaqueu, quase sem pedir licença. Mas, este o acolhe: “E Zaqueu desceu depressa e o recebeu com muita alegria”. Essa disponibilidade de Jesus mostra uma escolha e as pessoas percebem isso: “ele foi se hospedar na casa de um pecador”. Diante de Jesus, Zaqueu se compromete a viver um processo de conversão que consiste na justiça (restituir o que roubou) e na partilha com os pobres. Jesus proclama: “Hoje a salvação entrou nessa casa”. 

No episódio anterior, um cego passou a ver. Agora, Zaqueu viu e mudou de vida. Por isso, Jesus diz que a salvação entrou em sua casa. O “hoje” não é apenas o tempo em que o fato ocorreu. É o dia da salvação e da graça que se atualiza em cada hoje de nossas vidas. Ao trazer a salvação para Zaqueu e para todos, Jesus cumpre a promessa feita a Abraão: a salvação é a plenitude da promessa messiânica de participação do ser humano e do povo na vida divina. Essa promessa realiza todas as promessas da terra, da libertação e da vida para todos.

(texto do meu livro "Conversa com o evangelho de Lucas")

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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