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Meditação, sábado santo, 04 de abril 2015

Ontem, sexta-feira santa à tarde, fomos eu e um grupo de umas 15 pessoas do grupo da partilha (da Igreja das Fronteiras) até Dois Unidos, onde, no sítio de seu João, celebramos a oração da sexta feira santa. Sob a coordenação de Adriana, Verônica e Janaína, escutamos a paixão de Jesus segundo João, adoramos o Crucificado, contemplando nele as cruzes nossas e da humanidade de hoje e oramos pelas intenções nossas e de todo mundo. Para nós que fomos lá foi uma graça divina poder encontrar aquela comunidade pobre, ver a alegria de crianças e adultos e dar um sinal de comunhão e apoio à luta deles e delas.

Hoje, sábado santo, me preparo para a vigília pascal que celebraremos, eu e o grupo da partilha, na Igreja das Fronteiras, à noite. Combinamos de chegar pelas 18 horas para um retiro que é de curtição. Curtir a vigília que vamos celebrar. Para mim, celebrar a vigília pascal é como tomar uma injeção de rejuvenescimento, de força vital e de amorosidade. Recebi essa graça divina aos 18 anos, ao entrar no mosteiro de Olinda: li a história de um monge alemão Dom Odo Casel que passou toda a vida dele lutando em uma Igreja, na época muito fechada, para que a Igreja revalorizasse a vigília pascal que antes do Concílio Vaticano II não era realizada. Celebrava-se de manhã no sábado e de uma forma pouco pascal.

Ele conseguiu isso em 1955 ainda com o papa Pio XII que fez uma reforma do Tríduo Pascal e restaurou a vigília pascal, "mãe de todas as celebrações da Igreja", como chamava Santo Agostinho. 

Dom Odo Casel ficou tão marcado por isso que no ano seguinte (1956), foi encarregado na sua abadia de ser o diácono da vigilia. No momento em que estava cantando o Esxultet pascal, o anúncio da Páscoa teve um infarto e morreu sorrindo e dizendo: que graça divina poder morrer anunciando a Páscoa de Jesus.

Quando descobri essa história, fiquei eu muito envolvido e decidido a ir até às últimas conseqüências e descobrir por que, por que a vigília da Páscoa é tão importante. Até hoje, tenho a impressão de ter descoberto, mas não sei se sei explicar ou se consigo expressar tudo o que sinto sobre isso. De todo modo, deixo com vocês a homilia feita no século IV por Santo Agostinho que preparava os seus fiéis, o povo da sua diocese, para celebrar a vigília: 

Sermão de Santo Agostinho para o Sábado Santo

 (a tradução é um pouco atualizada)

Irmãos e irmãs queridos,

Nós recebemos um convite para vigiar nesta noite. Este convite nos vem do apostolo Paulo que escreveu aos coríntios que fazia vigílias freqüentes e pede que nós o imitemos. Com mais fervor ainda, devemos estar acordados nesta noite. Esta noite é a noite da vigília que é a mãe de todas as vigílias da Igreja. Nós temos de fazer vigília, nesta noite, irmãos, porque, por nossa forma de viver, nós éramos trevas, éramos noite. Hoje, somos luz no Senhor. Por isso, iniciamos esta Noite santa acendendo uma luz nova. Por esta luz que ilumina a nossa noite poderemos resistir e impedir que as trevas da noite voltem de novo a nos invadir. Por isso, é importante encher de luzes esta noite e não deixar a luz do fogo se apagar. Que a luz desta noite bendita ilumine não só o exterior mas o mais íntimo de cada um. É nesta noite que Deus realiza conosco a profecia do salmo que canta: “Mesmo as trevas não são trevas para ti. A noite é luminosa como o dia". De fato, para Deus, a escuridão não é mais escuridão. A noite brilhará como o dia”.

Na madrugada desta noite, antes que o sol brilhasse no horizonte, nosso Senhor Jesus Cristo, vencedor do pecado e da morte, ressuscitou. Nesta noite, nós que cremos, devemos vigiar. Nesta noite nasceu nossa alegria, ou melhor, renasceu do túmulo, porque do meio da escuridão brilhou a luz da ressurreição. A única tristeza que permanece é o peso de nossos pecados, mas Jesus Cristo ressuscitou para deles nos libertar. Alegremo-nos. Esta noite  já pertence, de fato, ao dia do domingo, porque a ressurreição de Jesus tornou esta noite mais luminosa que qualquer dia claro. A ressurreição iluminou nossas escuridões. E nós expressamos esta iluminação pelo sacramento do batismo, sinal e instrumento de nossa ressurreição com Jesus.

Por isso, irmãos, nossa fé fica tão fortificada pela ressurreição do Cristo, que todo sono vai embora e esta noite, cheia das luzes de nossas velas e dos fogos que acendemos nas Igrejas de todo o mundo nos faz esperar, com todas as Igrejas espalhadas pelo mundo, vigiar para não sermos surpreendidos no meio da noite dormindo e sim esperando o Senhor que vem.

É preciso que as chamas da fogueira aqueçam nossos corações e permitam que nossos espíritos vejam além de nossos olhos da carne. Consagremos esta noite que se acaba com o domingo por uma grande festa e proclamemos ao mundo que, mesmo no meio das dores e das trevas de todas as desordens, Deus faz brilhar a luz da ressurreição na qual somos batizados e pela qual somos chamados a viver com o Cristo, agora e sempre. 

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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