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Onde Deus se esconde

Onde a Palavra se esconde e a gente conspira

                  Neste XV domingo comum do ano A, somos convidados/as a escutar e meditar Mt 13, 1- 23. É o início do terceiro dos cinco discursos de Jesus no evangelho de Mateus. Este é sobre o reinado divino no mundo e é composto por sete parábolas ou comparações. Neste domingo, escutamos a primeira delas. A parábola do semeador.

O capítulo anterior de Mateus mostra Jesus no espaço da comunidade que é uma casa (Mt 12, 46- 50). Corresponde à Igreja doméstica que seria a forma original de Igreja. Este modelo de comunhão eclesial é o objeto da missão dos discípulos no discurso do capítulo 10. “Vão de casa em casa”. A partir de agora, o evangelho mostra Jesus na beira do lago, em relação não mais somente com discípulos e discípulas, mas com o povo da Galileia, gente pobre e sofrida. Mateus tinha dito que, depois do batismo e do seu retiro no deserto, Jesus foi para a Galileia, para se inserir entre a população mais empobrecida e considerada pecadora e misturada com estrangeiros. (Ver Mt 4, 12- 25). É este tipo de gente que ele reúne na beira do lago e anuncia o que Mateus chama de reino dos céus. 

A primeira coisa que chama a atenção é que o reino dos céus vem, mas vem de modo secreto ou íntimo. Vem como parábola ou enigma. Na intimidade, o grupo de discípulos e discípulas pergunta Por que Jesus fala em parábolas. Jesus explica que a parábola não é para revelar. É para esconder. Cita Isaías para dizer que, de fora, as pessoas olham sem ver, ouvem sem escutar e não interiorizam o que veem nem o que escutam. É preciso primeiramente se colocar dentro para compreender com o coração. O segredo do reino só é revelado ao pequeno grupo que Dom Helder Camara chamava de “minorias abraâmicas” e que podemos chamar de “cenáculos de resistência”. 

Na época de Jesus e dos evangelhos, anunciar que o reino ou reinado dos céus ou de Deus estava chegando era um ato subversivo. Implicava em romper com os impérios do mundo, especificamente, na época, o império romano que dominava a terra de Jesus.  Jesus manda os seus discípulos anunciar isso às aldeias mais pobres e ao povo da terra no campo. Os sacerdotes de Jerusalém compreenderam isso muito bem e quando o entregaram a Pilatos disseram: Se não condenas este homem, não és amigo de César, o imperador. Ou o reinado divino ou o império de César. 

Aos que lhe cobram porque este reinado divino que ele tinha anunciado, de fato, ainda não tinha chegado, Jesus responde com uma comparação. O lavrador pobre joga a semente na terra. Na época de Jesus, os terrenos da Galileia estavam nas mãos dos donos do império. Só restava aos lavradores as faixas de terra entre o cercado e as estradas, os terrenos estreitos das encostas das pedras. O lavrador não pode escolher. Nem dava para arar ou preparar a terra. No tempo de Jesus, o costume era semear antes de arar o terreno. Jesus diz que uma parte do terreno caiu na beira da estrada e logo foi pisada. A outra nasceu no meio das pedras, mas não tinha raiz morreu. E só uma parte caiu em terra boa e frutificou. Jesus diz que a semente é boa e é a mesma. O lavrador a reparte generosamente, mas o resultado da colheita depende do terreno. Se o terreno não é favorável, a semente morre. Fica infecunda. A semente é a mesma, mas os resultados podem ser opostos. 

Basta ver isso no próprio evangelho. Jesus curou um doente. Para quem foi curado e para os discípulos, aquela cura era sinal da vinda do reino de Deus. No entanto, para os professores de Bíblia e religiosos de Jerusalém, só podia ser sinal que Jesus agia por obra do espírito mau. O mesmo sinal provocava fé em algumas pessoas e escândalo em outras. Até hoje, é assim.  A proposta de reforma agrária que o MST está propondo para uns é questão de justiça. Para outros é comunismo e destruição da economia. 

Uma coisa que impressiona é apesar de tudo a confiança de Jesus. Um otimismo quase ingênuo imaginar que a pequena parte que sobrou, a semente que caiu em terra boa possa dar cem por cento, ou mesmo trinta por cento. É muito. É quase impossível. De todo modo, a palavra de Jesus é este apelo à confiança. Apesar de que ainda estamos em tempo de plantio, confiemos que, apesar de tudo, a colheita pode ser muito boa.  

Ao concluir esta meditação, sugiro que cada um/uma de vocês medite qual a ou as parábola/s do reinado divino, Deus tem suscitado na sua vida. Pode ser que só quem está por dentro possa perceber aquilo como parábola do reino e possa compreender. Neste mundo urbano e da informática, vamos descobrir as parábolas através das quais o reinado divino tem sido semeado em nossas vidas pessoais e no trabalho de gerar um novo mundo possível. 

 

 

 

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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