2o Congresso das Comunidades Cristãs
Cametá tem mais de cem mil habitantes. Fica na margem norte do rio Amazonas, a umas seis horas de barco de Belém. Aqui a diocese está celebrando os 50 anos das comunidades de base que aqui se chamam simplesmente Comunidades cristãs.
Cheguei na quarta-feira depois de ser apresentado a horas e horas de viagem por dentro do rio no qual a primeira impressão é da força da natureza que resiste e se impõe depois de todos os ataques da sociedade humana. Rio acima de Belém para cá passamos por navios grandes, petroleiros, barcos pequenos e barcos pesqueiros. Nas margens pequenas aldeias e às vezes nem isso, somente uma ou outra casa de ribeirinhos no meio da floresta e nas margens inundadas do rio que mostra estar em meio a troncos de árvores cobertos e em alguns lugares até tetos de casebres de palhas.
Cametá foi a única cidade maior que encontrei por aqui. Ruas estreitas e estilo de cidade amazônica. A diocese me hospeda na casa paroquial mais próxima do rio. O encontro das comunidades começou ontem à tarde com belas perfomances de grupos de juventude e apresentações das paróquias presentes (10). De fato, pelo que percebo, as comunidades cristãs daqui são todas ligadas às paróquias. O bispo Dom José Altevir parece um homem simples, aberto e apaixonado pela missão junto aos pobres. Quando o vi com que carinho tratava os índios aqui presentes e as rezadeiras populares (tirei uma foto dele junto com elas), agradeço a Deus por ele e por essa Igreja local. A maioria dos 23 padres da diocese também me parece aberta e solidária. Estou convidado pela diocese para, nesse encontro, falar sobre o que o Sínodo sobre a Amazônia pode trazer para nossas Igrejas (da Amazônia ou não). Certamente eles teriam pessoas da região que pudessem falar sobre isso, mas como me escolheram, me senti comprometido e vim.
Hoje é um dia de memória dos 50 anos e amanhã de tomar o pulso para ver como estão as comunidades e apontar caminhos para o amanhã. Pessoalmente, fico feliz por encontrar uma Igreja local na qual a opção pelas comunidades pobres e pelos problemas sociais (o desmatamento, as consequências nefastas para os pequenos dos grandes projetos – essa é a diocese de Tucuruí – a hidroelétrica que acarretou tantos problemas para índios, ribeirinhos e para os que vivem da pesca). Vendo e ouvindo os testemunhos e convivendo um pouco com os padres percebo uma Igreja que opta pelos pobres mas que ainda não conseguiu mudar o seu estilo de espiritualidade. Como ajudar nossa Igreja a perceber que há uma clara e profunda contradição entre a teologia e espiritualidade de Cristandade (colonizadora) com sua visão de missão que usa palavras evangélicas (como faz Aparecida: discípulos e discípulas missionárias) mas para que missão? Qual exatamente? Como redescobrir que o evangelho é boa notícia do reino, isso é, do projeto divino no mundo e não de uma doutrina ou prática religiosa. De todo modo, me curvo admirado e comovido diante desses irmãos e irmãs que consagram suas vidas aos mais pobres e em lugares tão precários e distantes do mundo hegemônico. Fico feliz de ver alguns padres jovens identificados com esse estilo de Igreja pobre e para os pobres. Deus seja louvado. Há alguns grupos de religiosas inseridas na pastoral e trabalhando com o povo. Ontem, encontrei algumas das queridas irmãs da Sagrada Família que me deram a primeira formação religiosa quando eu era criança em Camaragibe e têm uma casa aqui.
Que Deus nos ilumine nos caminhos que o documento de trabalho do Sínodo propõe: ouvir a voz da Amazônia profunda (voz dos povos indígenas, dos seringueiros, dos ribeirinhos, etc), ouvir a voz das águas e da natureza, transformar nossas paróquias em eco-paróquias e assumir a Ecologia integral como missão da Igreja. Vou simplesmente repetir isso e explicar melhor as propostas da REPAM (Rede eclesial pan-amazônica). E o mais é confiar na ação do Espírito.