3º Domingo do Advento – Jo 1, 6- 8 e 19- 21.
A alegria da esperança equilibrista na contramão do mundo
Chegamos ao terceiro domingo do Advento e assim iniciamos a segunda parte deste tempo litúrgico. A celebração de hoje é marcada pelo cântico de entrada, inspirado na palavra do apóstolo Paulo: “Alegrai-vos”. É o domingo no qual a espera se torna alegria por causa da proximidade da vinda do reino de Deus, representado pelo Cristo. Alegremo-nos por ser testemunhas de uma fé profética e de uma espiritualidade libertadora.
O evangelho (João 1, 6- 8 e 19 – 28) nos apresenta o testemunho de João Batista, só que não mais como precursor do Cristo e nem mesmo o denomina a partir de sua função: Batista, como os outros evangelhos o apresentam. O prólogo do quarto evangelho diz apenas: “Houve uma pessoa humana enviada por Deus. O seu nome era João e ele veio como testemunha”.
Quando no final do século I, a comunidade do discípulo amado escreveu esse evangelho e até hoje, está em curso um julgamento. Em questão, estão dois projetos para a organização do mundo. Um é o projeto da sociedade dominante e é inspirado pelo desamor e pelo egoísmo interesseiro. Outro é o Projeto divino de amor e de aliança, baseada na Vida para todos e todas. João veio como testemunha deste projeto.
Talvez mais do que nunca, esse projeto precisa de testemunhas. Conforme o quarto evangelho, o processo contra o projeto divino não é levantado pelo império ou por ateus. São os sacerdotes, dirigentes da religião que mandam de Jerusalém uma delegação para investigar e interrogar o profeta João a respeito da sua pessoa e de como compreende a sua missão.
Em nossos dias, quem mais contesta e se opõe ao projeto de renovação da Igreja, proposto pelo papa Francisco não são os inimigos da religião, mas são justamente os que se dizem mais religiosos e um bom grupo de padres, bispos e cardeais.
Esse evangelho conta que os religiosos do templo sabem que a função do Messias (do Cristo) quando viesse seria reformar as estruturas e mudar as leis. Por isso, se inquietam. João atua do outro lado do Jordão. Portanto, fora da jurisdição dos religiosos de Jerusalém. Mas, para eles, isso pouco importa. Mandam a delegação. Provavelmente, naquele grupo, foram alguns policiais do templo. Se João confessasse ser o Cristo, eles o prenderiam. Mas, João diz: “Eu não sou o Cristo”.
Então, eles perguntam: Quem é você? O que você diz de si mesmo? João responde sem nem usar verbo: “Eu, uma voz no deserto”. Os fariseus querem saber com que autoridade ele batiza”. Até hoje, é assim, há os que se sentem proprietários da religião e dos ritos. João explica que batiza com água, mas vem alguém que nos mergulhará no Espírito de Deus. E afirma: “No meio de vós, está alguém que não conheceis”. Até hoje, a fé profética de João diz isso à religião que, mesmo no seio das nossas Igrejas cristãs, continua o modelo de religião do templo. O profeta João insiste que não basta conhecer ritos e leis. É preciso reconhecer o Cristo no meio de nós: o Jesus da gente, com rosto de negro, sangue de índio e corpo de mulher. Nas Igrejas cristãs, hoje, quantos o reconhecem assim?
Como o profeta João, somos testemunhas de um Cristo que está no meio de nós e não o conhecemos. Vocês lembram de um cântico que as comunidades eclesiais de base cantavam muito nos anos 70:
Entre nós está e não o conhecemos...
Seu nome é Jesus Cristo e passa fome...
O maior escândalo do mundo atual é que a fome aumenta, a pobreza se multiplica e os países nos quais isso mais acontece são os que se dizem de cultura cristã. No Brasil e em outros países, ainda há pastores e fieis das Igrejas cristãs que julgam mais importante garantir o cumprimento de normas morais da Igreja no campo sexual do que insistir na realização da justiça social e da Paz.
O apelo do evangelho de hoje é para que sejamos testemunhas da Palavra que se faz carne na vida do nosso povo e que este Natal vem recordar. Todos nós precisamos de uma causa última pela qual viver, um projeto ao qual nos consagramos totalmente. E para viver isso, precisamos ser capazes de auto-transcendência, isso é, de viver para além de nós mesmos, de nossos impulsos, caprichos e desejos do momento. Isso não quer dizer negar ou rejeitar os desejos e prazeres, mas ser capazes de dar a eles dimensão de transcendência, ou seja, de permanente abertura e capacidade de evolução. É nesse sentido que Pedro Casaldáliga afirmava que as nossas causas são mais importantes do que a nossa vida. É esta a nossa fé no reino. É o que nos faz cantar: “Irá chegar um novo dia
Um novo céu, uma nova terra, um novo mar
E nesse dia, os oprimidos, a uma só voz,
a liberdade, irão cantar”