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A energia divina revolucionária dentro de nós


O Amor Divino, força, libertação e Vida

                   “O Espírito do Senhor, 

o universo todo encheu. 

Tudo abarca em seu saber, 

tudo enlaça em seu Amor, 

Aleluia, aleluia, aleluia, aleluia”

 Este verso bíblico, inspirado no Livro da Sabedoria (Sb 1, 7) é o refrão que, desde tempos muito antigos, a Igreja Latina usa para iniciar a celebração dessa festa de Pentecostes. Ele expressa bem a alegria que celebramos neste dia: a energia do amor divino espalhada por todo o universo. A ventania divina do Amor está presente em todas as criaturas e move o universo como grande organismo vivo, no qual tudo está interligado e tudo depende de tudo. 

No Judaísmo, Pentecostes é Shuvot: a festa das Semanas, ou seja, das colheitas. Na celebração deste domingo, a primeira leitura é o relato dos Atos dos Apóstolos do primeiro Pentecostes cristão que coloca como o Espírito de Deus veio como colheita da ressurreição de Jesus, 50 dias depois. Pentecostes inverte Babel e retoma o acontecimento do Sinai no qual Deus firma a aliança de amor com o seu povo.  No primeiro Pentecostes cristão, contado no livro dos Atos dos Apóstolos (capítulo 2, 1- 11), o Espírito vem sobre a comunidade dos primeiros discípulos e discípulas de Jesus e lhes dá o dom de se compreenderem uns aos outros. O Amor Divino lhes permite falar de modo que muitas pessoas, vindas de vários lugares do mundo  e que falavam línguas diferentes, os compreendessem, cada uma no seu idioma. Pentecostes é a possibilidade de convivência e comunhão na diversidade das linguagens e de cada cultura. É o dom do diálogo entre culturas, entre gerações e entre espiritualidades. 


Em nossos dias, grande parte do Cristianismo é pentecostal, principalmente entre as pessoas mais pobres. As Igrejas e movimentos pentecostais têm função profética importante. Insistem no fato de que Pentecostes não foi só no primeiro momento do Cristianismo. Ocorre para nós cada dia. Deve ser vivido como acontecimento permanente e sempre renovado. Hoje, o Espírito vem de novo e nos dá os seus dons. 

O Pentecostalismo começou há mais de cem anos, em comunidades cristãs negras dos Estados Unidos, que reagiram ao racismo institucional, revelando às Igrejas e ao mundo, que o Espírito de Deus vem às pessoas pobres e às comunidades negras. Inspira as lutas das mulheres e conduz a todas as pessoas que são marginalizadas. Vem lhes dar força e luz para as lutas da vida. 

Infelizmente, em nossos dias, alguns grupos pentecostais se embranqueceram culturalmente e caíram no dualismo que divide o espiritual e a vida. Nos evangelhos, Jesus nos revelou que, quando o Espírito de Deus desceu sobre ele, o enviou para curar doentes, para libertar as pessoas que estavam presas e para anunciar a libertação que é para todos e todas: libertação integral, não só interior e moral. O que caracteriza Jesus é ser pentecostal como revolucionário e ser revolucionário como pentecostal. Podemos aprender isso de Jesus e unir essas duas dimensões da fé: o carisma pentecostal e a ação transformadora e revolucionária no mundo.  

O contrário do espírito pentecostal é o fundamentalismo. O apóstolo Paulo afirmou: “A letra mata. É o Espírito que faz viver”  (2 Cor. 3, 6). Hoje, nas Igrejas, existe fundamentalismo bíblico, fundamentalismo teológico e agora está na moda o fundamentalismo litúrgico que traduz textos latinos e antigos ao pé da letra e ensina que se quem celebra não recita literalmente cada sílaba do texto, Deus não aceita aquele sacramento. 

 

No evangelho proclamado neste dia (João 20, 19- 23) temos outro modo de contar o mesmo presente que recebemos de Deus. De acordo com esse relato, é no próprio domingo da ressurreição, que, na sua primeira manifestação ao grupo dos discípulos e discípulas reunidos, Jesus Ressuscitado  vem, sopra sobre eles (e elas) e lhes dá o seu Espírito. A Bíblia conta que, no início, Deus soprou sobre a primeira humanidade para lhe dar vida. Assim, o Cristo Ressuscitado sopra sobre cada pessoa do grupo para lhe dar vida nova. Essa vida nova é a paz da aliança. É o dom da alegria messiânica. 

Na véspera da partida, Jesus tinha prometido: “Vocês estarão tristes, mas eu hei de ver vocês novamente e aí vocês vão se encher de uma alegria imensa (Jo 16, 20- 22).  Agora, o evangelho de hoje diz que eles e elas se encheram de imensa alegria ao verem o Senhor. E aos dons maravilhosos da paz e da alegria, o Ressuscitado junta ainda outro: o da reconciliação e do perdão. Nesse evangelho, Jesus não dá aos discípulos e discípulas a alternativa de perdoar ou não. Encarrega-os de discernir a realidade e dizer em nome de Deus quem é responsável e quem não é. É disso que se trata. Se nos abrirmos hoje ao Espírito Santo, seremos mesmo, eu e cada um/uma de vocês, profetas, profetizas de Deus. Portadores do Espírito. E com a tarefa de dizer o que “o Senhor nos manda dizer e fazer” nas Igrejas e no mundo. Mesmo se já nos alegramos com a presença em nós do Espírito, a Igreja nos aconselha a sempre pedirmos que Ele venha de novo e cada vez com mais força e nos impregne com o seu amor. 

Hoje, partilho com vocês, hoje, a oração de um místico muçulmano medieval que, de certa forma, revela como essa presença do Espírito se dá na pessoa que vive a fé e o amor divino: 

 “De Ti e de mim, eu me admirei, ó meta do meu desejo. 

Aproximaste-me tanto de ti que acreditei que fosses meu eu. 

Ao te encontrar, tanto me ocultei, que em Ti fizeste que eu me extinguisse. 

Ó Tu que és minha graça, enquanto vivo e paz tranquila quando estiver sepultado. 

Só em ti reside o meu amor, porque és meu temor e segurança. 

Nos jardins dos teus significados, está contida toda minha arte, 

e se ainda desejo alguma coisa, és somente Tu todo o meu desejo!” (Oração de Al-Hallaj)[1].



[1] - Cf. Cf FAUSTINO TEIXEIRA e WOLNEY BERKENBROOK, Sede de Deus, Orações do Judaísmo, Cristianismo e Islã, Petrópolis, Vozes, 2002, p. 13. 

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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