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A palavra de ordem é Amar

Marcelo Barros

Neste 5º Domingo da Páscoa no ano C, o evangelho proposto pelo lecionário ecumênico é João 13, 31 a 35. São palavras que Jesus teria dito na última ceia, depois de ter lavado os pés dos discípulos e logo após ter anunciado que sairia dali para ser preso e assassinado pelos poderosos da Política e da Religião. Conforme o evangelho, Jesus proferiu estas palavras, assim que Judas saiu para combinar com os religiosos do templo como lhes entregaria o Mestre.

O evangelho deixa claro que Jesus sabia que Judas ia traí-lo. Ao dar a Judas o primeiro pedaço de pão molhado, Jesus fez um gesto de carinho e de predileção por ele. Quando alguém está movido por um espírito de ressentimento ou raiva, até um carinho que lhe é feito, a pessoa vê como agressão. Sendo assim,  no lugar de ser tocada pelo amor, a pessoa se endurece mais ainda. O evangelho chega a dizer que, quando Judas recebeu aquele gesto carinhoso de Jesus, “a energia do mal, ou seja, o diabo, entrou nele. Jesus percebeu isso e lhe disse:  “O que você tem de fazer, faça logo”. Como Judas cuidava da bolsa comum, os discípulos pensaram que Jesus estivesse se referindo a alguma coisa de economia.

E a começa o texto do evangelho que lemos hoje: Assim que Judas saiu da sala, Jesus afirmou: “Agora, o Filho do Homem foi glorificado e a glória de Deus se manifestou nele”. Jesus vê a glória de Deus se manifestar através da traição de um discípulo e no complô armado para a sua condenação. O que significa isso? O que seria essa glória de Deus?

Conforme o evangelho de João, durante a realização de sua missão, Jesus fez vários sinais de amor, como transformar a água em vinho, curar o filho ou servo de um oficial romano, repartir pão para uma multidão faminta, curar um cego de nascença e restituir vida a Lázaro. Esses gestos de amor que Jesus fez foram sinais da glória, isso é, sinais do amor de Deus pela humanidade. Agora, Jesus diz que quer fazer da própria morte sinal maior da glória de Deus. Não porque quisesse morrer, ou pensasse que Deus queria que ele morresse. A verdadeira razão para Jesus fazer isso é revelar que o amor é maior do que a morte. O amor deve prevalecer sobre o ódio e sobre o poder do mundo que mata. É esse amor que o leva a enfrentar o martírio. É esse amor que Jesus quer passar à sua comunidade. Quer que a sua comunidade viva este amor, não só naquele momento, mas sempre. Por isso, dá aos discípulos e discípulas um novo mandamento: “Amai-vos uns aos outros, umas às outras, como Eu vos amo”.

Nessa palavra, há dois aspectos importantes: O primeiro é que Jesus faz do amor uma palavra de ordem: uma bandeira de vida e de luta. E segundo: Para Jesus, a vida regida por este amor é a única forma de se viver a intimidade de Deus. Antes se buscava a intimidade de Deus na religião do templo e nas leis morais. Agora, a intimidade com Deus pode ser buscada mais profundamente na prática do Amor como forma de viver.  

Alguém pode perguntar como o amor pode ser mandamento. Como se pode mandar alguém a amar?

Comumente compreendemos o mandamento do amor como dirigido a cada um de nós, de forma individual. Cada um/uma de nós é chamado a viver este caminho de amor, mas como caminho comunitário. O mandamento tem implicação na vida de cada pessoa. No entanto, é uma palavra de ordem dirigida à comunidade. Jesus falou em vós e não em tu. É a comunidade que deve ser a tenda na qual este amor se realiza e se expressa. E aí, novamente, podemos ver a figura de Judas como simbólica. Ele trai Jesus ao tomar um caminho individual, quase como escondido da comunidade e entrega Jesus ao poder dos sacerdotes e religiosos do templo. 

Podemos ver Judas como figura simbólica de todo discípulo que trai o evangelho, aprisionando-o ao poder religioso do templo. Cada vez que aprisionamos Jesus na religião do culto e das normas, de certa forma, agimos como Judas. Hoje, quantos padres e pastores fazem isso? Será que nós mesmos, de vez em quando, não caímos nesta tentação de reduzir o evangelho, a boa nova do reino que Jesus nos deu ao poder da estrutura religiosa, católica, anglicana, batista, pentecostal, ou seja lá qual ela seja?

De fato, o que Jesus diz é que se a sua comunidade quer continuar a sua missão, o fundamento de tudo é amar. Amar não apenas como sentimento, como emoção e sim como princípio organizador da vida, critério e direção que dou à minha vida afetiva, ao meu estilo de vida, tanto no plano pessoal, como no nível social e político.

Os evangelhos sinóticos dizem que Jesus retoma o mandamento do Livro do Levítico e ensina que o maior mandamento é unir o amor a Deus ao amor ao próximo, como a si mesmo. Agora, o evangelho de hoje diz que Jesus nos pede para amarmos uns  aos outros (umas às outras), como Deus nos ama. Amar com o próprio amor divino em nós. Possibilitar que o nosso modo de amar seja sinal e manifestação do amor de Deus em nós e através de nós. O biólogo chileno Umberto Maturana ensina que o ser humano é biologicamente nascido pelo amor e condicionado para amar. Quem não ama adoece. Neste mundo, dominado pelo desamor, este amor estrutural e básico precisa se traduzir em expressões sociais e políticas.   

A política para ser verdadeiramente política deve ter como raiz o amor e sua expressão deve ser o cuidado com os mais vulneráveis e vítimas das desigualdades sociais. Quem acolhe o mandamento de Jesus expresso no evangelho de hoje é chamado/a a trabalhar para que a política, em todos os seus níveis, seja a arte do amor coletivo, expresso no cuidado com a justiça eco-social e uma sociedade mais igualitária. 

 

 

 

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Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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