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A urgência da Justiça, fé e oração

XXIX Domingo comum C: Lc 18, 1- 8. 

Marcelo Barros

 

Um dos pontos mais discutidos no Brasil de hoje é a relação entre Política e Religião. O atual presidente tenta ganhar eleição se apresentando como homem religioso e muitas pessoas têm como critério para votar que o candidato seja ligado à Igreja. No dia 02 de outubro,  assembleias estaduais e o Congresso se encheram de pastores e pessoas ligadas ao mundo religioso. Há quem sonhe com um Brasil evangélico, pentecostal ou católico romano. Confundem a construção da pátria com a volta de uma Cristandade dominadora, que usa o nome de Deus para manter o mundo injusto e desigual. Ao mesmo tempo, muitas vezes, as mesmas pessoas e grupos que votam na extrema-direita por esta parecer religiosa, negam que a fé tenha dimensão social e politica. Pensam o mundo como uma grande paróquia ou congregação e não assumem a missão de transformar a sociedade a partir da justiça e do cuidado com todos os seres humanos, com a terra e a natureza.

Sobre isso, é muito oportuno e feliz que, neste XXIX domingo do tempo comum, o calendário litúrgico traga como evangelho a ser lido e meditado Lucas 18, 1 – 8. O evangelho começa dizendo: “Jesus contou aos discípulos uma parábola para mostrar a necessidade de orar sempre”. A história escolhida foi a de um juiz injusto e de uma pobre viúva que pedia justiça. E Jesus conclui a parábola afirmando: “E Deus, não fará justiça aos seus escolhidos, que dia e noite gritam por ele? Será que vai fazê-los esperar? Eu vos digo que Deus lhes fará justiça bem depressa. Mas o Filho do homem, quando vier, será que ainda vai encontrar fé sobre a terra?".

Conforme este evangelho, quando Jesus quer ensinar aos discípulos e discípulas a viver permanentemente um estado de oração, conta uma parábola sobre a justiça  e conclui garantindo que Deus fará justiça. E conclui com a pergunta: Mas, será que o Filho do Homem, quando chegar, encontrará fé sobre a terra? Assim, ele identifica a fé e a oração com a busca da justiça. Não podia ser de outro modo, porque ele foi formado na tradição bíblica. Ali o livro dos salmos, que é a escola de oração do povo bíblico,  começa com o salmo 1, dizendo: “Abençoado quem vive a lei de Deus e pratica a justiça”. Esta é a base, o alicerce para a oração bíblica. Oração não baseada na justiça é idolatria. Como diz o livro do Eclesiástico: “Deus não se deixa corromper por propina ou suborno. Oração desligada da prática da justiça é ofensa a Deus, porque é como matar ou maltratar um filho, pensando, assim, agradar ao pai”  (Eclo 34, 18- 21). 

Jesus contou a história de uma viúva pobre e indefesa que pedia justiça e de um juiz que parecia ser da bancada da Bíblia (lida de forma fundamentalista e fanática) e, ao mesmo tempo, da bancada do boi e da bala. Não era de Deus aquele juiz, nem Jesus quis compará-lo com Deus. O que Jesus disse foi que, se mesmo um juiz como aquele, injusto e insensível, acaba cedendo e fazendo justiça para se ver livre da viúva que o importunava, quanto mais Deus fará justiça às pessoas que ama, Ele que é amor e justiça.

Não podemos imaginar que Jesus tenha comparado Deus com um juiz insensível à injustiça. No capítulo 11 deste evangelho, ele já tinha contado a história do amigo que atende ao outro que lhe pede um pedaço de pão só para não ser mais incomodado. Agora, Jesus diz o mesmo que tinha dito antes: “Se vocês que são maus, sabem dar coisas boas aos seus filhos, quanto mais o Pai do céu...” (Lc 11, 13). Só que, desta vez, Jesus passa do tema da oração ao da justiça: “Deus não faria justiça aos seus escolhidos?”. O que a viúva pede é justiça. O que Jesus promete que Deus dará é justiça.

Para nós, o que essa parábola pode dizer é que, na aliança que vivemos em Deus e com Deus, este não pode ser tapa-buraco das nossas necessidades e carências. A nossa oração é na linha de Jesus quando se situa na expectativa do reino que vem. No fundo, toda nossa oração se insere no espírito e no âmbito da súplica do Pai Nosso: “Venha a nós o teu Reino!” A comunidade de Lucas que lida com o aparente atraso da vinda do Senhor tem aí a resposta de Jesus: é preciso não desanimar sempre em nossa esperança.

É claro que isso não “desculpa” a Deus, nem explica porque Ele permite tanto sofrimento e tantas injustiças no mundo. Por que Deus parece mudo e impotente diante de calamidades que atingem a humanidade, principalmente, a parte mais pobre?

Talvez, nessa perspectiva, nossa oração não seja apenas o grito da pessoa que sofre e clama por justiça, mas o protesto e a teimosia em nos manter na confiança diante dos silêncios de Deus.

Este evangelho de hoje se conclui com uma frase desconcertante: “E o Filho do Homem, quando vier, será que encontrará fé sobre a terra?”.

 À primeira vista, parece uma afirmação fora de contexto. De fato, se liga com a pergunta que, no capítulo anterior, os discípulos tinham feito sobre a vinda do Filho do Homem (17, 22- 37).

Em uma Igreja vazia, um rapaz estava orando. De repente, entra naquela Igreja uma criança, vê o rapaz em silêncio e lhe pergunta:

- O que você está fazendo?

O rapaz em oração lhe responde:

- Estou esperando um amigo que vem....

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Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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