Ao completar 74 anos de vida....
“Bendiga a minha vida à Ternura Divina, A seu nome, cante todo o meu ser,
De seus favores e graças sem medida, Jamais poderemos nos esquecer.
Por toda tua vida, de bens te sacia, Como a da águia, tua juventude se renova,
O Eterno Amor realiza sua justiça libertadora, A quem é oprimido, liberta e promove”
(Salmo 103 – tradução do livro Diálogos com o Amor).
Hoje, ao dar graças a Deus por mais um ano de vida, me sinto um pouco como Jesus, diante do túmulo de Lázaro, ao dar graças a Deus por uma vitória da vida que ainda iria se manifestar (no caso, Lázaro ainda estava no túmulo). No meu caso, há muitas vitórias de Deus sobre a morte e doenças traiçoeiras. Há a mão de Deus me conduzindo por meio de curvas e túneis nem sempre fáceis de atravessar. Há imensa graça divina no pouco que consigo fazer em assessorias e ajudas às pastorais e aos movimentos sociais, mas principalmente no tanto que tenho sempre aprendido nesse caminho e em tantas graças que recebo dos companheiros e companheiras de luta e de caminhada.
Este ano de 2018, em vários aspectos, não foi fácil. Em janeiro, tivemos eventos importantes, como o 14º encontro intereclesial de CEBs em Londrina, palco de fortes tensões provocadas por grupos de direita que tumultuaram o encontro. Em março, tivemos o Fórum Social Mundial e com ele o fórum de Teologia e Libertação, além de uma assembleia da Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo (ASETT). Ali entreguei o cargo de coordenador latino-americano da ASETT e mesmo depois, tenho procurado colaborar sempre em tudo o que posso. Além disso, tive um calendário cheio de encontros, retiros e cursos que assessorei. Mas, pelo que todos vimos, no plano da Política, a barbárie se impôs e as eleições desse ano nos revelaram um quadro difícil para o país.
Há muitos sofrimentos diante dos quais nos sentimos impotentes. Há poucas semanas, em Pernambuco, um pai de família pobre do interior veio à capital e perdeu os seus documentos. Voltou à sua cidade e se apresentou à delegacia da sua cidade (fez o BO). Mas, os documentos foram encontrados no Recife em um carro roubado e por isso a polícia o prendeu (disse que ele deveria ter feito o BO em Ipojuca, mas também no Recife) E o rapaz está preso e até agora o advogado não conseguiu soltá-lo. Há tantos outros casos assim. Na prisão, um grupo dorme em pé por algumas horas e depois troca de lugar com os que estavam deitados que passam então a dormir de pé... Essa é a realidade brasileira. E no Paraná, Lula, inocente, é símbolo de todos esses pobres que são injustamente presos e não têm como se defender.
No hemisfério sul, novembro é final de primavera. Mas, a primavera interior nunca se acaba. É sempre tempos de novas possibilidades e de novos começos. Um tempo de esperança para renascer. Nas regiões mais frias, a primavera nasce depois da quietude do inverno. A primavera nos lembra a nossa infância e me faz lembrar que o universo brota e vive em mim. E em mim, é o universo que está sempre mudando.
A terra, mesmo agredida, respira sempre novas formas de vida. Quero escutar e acolher.
Prestar atenção às sementes que se abrem; Ver as raízes que crescem fortes sob a terra.
A erva verde que brota depois do frio do inverno. Quero escutar e acolher.
Os espinhos que dão flor e os ramos nus que se cobrem de brotos.
As flores silvestres que, ao vento, dançam nas campinas.
Quero escutar, acolher e partilhar com meus irmãos e irmãs,
Essa ternura da vida que sempre teima em renascer.
Há uma espécie de gravidez da vida fora e dentro de nós,
Os ipês amarelos e vermelhos em meio ao asfalto da cidade,
Há flores que resistem e insistem mesmo em meio à secura,
Como precisamos ser na ternura e firmeza, forte resistência,
em meio às durezas e aos ataques bolsonarianos da vida.
Preciso mais de alguns anos para, com meus irmãos e irmãs,
continuar a luta para que, no mundo e em nós, nunca desistamos da primavera
Quero escutar e acolher esses sinais de resistência, para dar mais amor e ternura a essa luta divina.
Amém.