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​Artigo, quinta feira, 13 de junho 2013

Ontem, no Brasil, foi dia dos namorados e hoje é festa de Santo Antônio, o santo que o pessoal considera casamenteiro. Estou em São Paulo para assessorar um retiro da diocese anglicana de São Paulo, a pedido do meu amigo, o bispo Dom Maurício Andrade.

Hoje, quero repartir com vocês um artigo escrito por uma teóloga do Rio, muito amiga minha, Maria Clara Bingemer. Ela escreveu para o dia dos namorados, mas vale a pena ler esse artigo em qualquer dia do ano.

ACREDITAR NO AMOR

 Maria Clara Lucchetti Bingemer, teóloga, professora do Centro de Teologia  e Ciências Humanas da PUC-Rio.

          Já dizia o grande teólogo suíço Hans Urs von Balthasar: só o amor é digno de fé.  Para mim, a esta altura da vida, já com mais de 60 anos,  44 de casada  e avó de cinco netos, não há nada que seja mais digno de fé. Não há outra coisa que mova montanhas, que seja digna de credibilidade e das apostas mais ousadas e absurdas que o amor.

          Pois celebrando o Dia dos Namorados penso que é hora – como o é sempre – de relembrar esta verdade.  Amor é coisa de experiência, de prática, mas também tem – e muito! – a ver com a fé.  É preciso acreditar, para que o amor se constitua como sólido, belo, profundo.  É preciso fé, para que não falhe o amor e se transforme em volatilidade irresponsável.  Andar com fé é preciso e a fé não costuma falhar.  Sobretudo quando é fé no amor.

          Os gregos distinguiam três formas de amor: Eros, feito de desejo, atração, pulsão sexual e energética; filia, o amor mais de amizade, fidelidade; e agape, feito de oblatividade desinteressada e gratuita, entrega total e generosidade, fé e confiança inesgotáveis, paciência que se reinventa a cada dia.

          Hoje se tem a impressão,  olhando os namoros e também as experiências de vida a dois, as uniões estáveis e os casamentos, de que o primeiro sentido tem a tendência de engolir os demais e ser interpretado em dimensão totalizante.  Isso tem como consequência relações curtas, rápidas, efêmeras, deixando atrás de si um rastro de frustração e infelicidade e – pior ainda – crianças inocentes, que não pediram para nascer e acabam sendo frutos irresponsáveis de relações mal compreendidas.

          Os diversos analistas do assunto emitem diagnósticos que, em geral, vão na direção de um esgotamento do desejo, entendido aí como desejo sexual.  Parece-me que o problema é outro.  Pelo menos em muitos casos, pois a generalização neste particular, como em outro, é sempre odiosa.  O problema é falta de fé, de acreditar que o amor não acaba, apenas muda de configuração com o passar do tempo. E que é preciso estar atento para poder reinventá-lo e redescobri-lo a cada passo.

          Reinvestir, apostar de novo, cultivar o que parece morto é algo que ninguém está disposto a fazer.  Tem pressa de livrar-se do parceiro ou parceira, sem o qual não parecia poder viver.  Às vezes é apenas uma fase, um período a passar que, se enfrentado adequadamente, poderia reemergir com beleza e profundidade muito mais maduras e melhores.

          Mas não. Há que cortar, terminar, partir para outra.  Há urgência em deixar para trás o amargo sabor dos últimos tempos não felizes, tão diferentes dos iniciais.  E busca-se outra relação, que dentro de um tempo também se mostrará temporária, efêmera.  E novas frustrações serão vividas, novas dores, novos sofrimentos. 

          Meu Deus!  Será que não dá para investir um pouco mais?  Acreditar nas promessas feitas e nos dias vividos quando o mundo parecia acabar se ele ou ela não estivessem presentes?  Não dá para confiar que as noites passadas em claro esperando o dia raiar para ver de novo a pessoa amada foram reais e não produto da imaginação?

          Jovens e adultos – porque hoje namoro não é só coisa de jovens, mas também de adultos – tenham fé.  É preciso acreditar.  Amor é graça,  mas também tarefa.  Aquilo que aconteceu às vezes sem esperar, sem procurar, tem que ser trabalhado e retrabalhado.  Em cada etapa da vida.  Da paixão alucinante e urgente se passa ao cotidiano compartilhado que é feito não só de alegrias e êxtases, mas também de cansaço, trabalho, tentativas constantes de superar dificuldades. 

          Quando chega um filho, após a alegria do nascimento, a intimidade sofre.  Há que atender o bebê em noites insones que resultam em dias pesados, em pálpebras mais ainda e em impaciências várias.  Se há amor, há superação desta fase e o amor renasce.  Senão, como haveria o segundo filho e, às vezes, o terceiro? Ou vai se achar que está na hora de acabar porque o menino chora de noite?  O outro também chorará.  E o outro.  E o outro...

          Já dizia o grande artista belga prematuramente falecido Jacques Brel, em sua inesquecível canção “Ne me quitte pas”,  que “há terras queimadas que dão mais trigo que o melhor abril” e quando, ao cair da noite, o céu se inflama, “o vermelho e o negro se encontram e se fundem.”

          Há que acreditar que a terra seca voltará a ser fecunda.  E dará frutos melhores que o melhor dos abris.  Acreditar no amor: espero que tenham tido um feliz Dia dos Namorados.

A   teóloga é autora de “O  mistério e o mundo – Paixão por Deus em tempo de descrença”, Editora Rocco. O lançamento será no dia 27 de junho, a partir de 19 horas, na Livraria Timbre, Shopping da Gávea – rua Marquês de São Vicente 52-2º piso. Se você mora no Rio, apareça. Estaremos esperando por você. 

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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