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​artigo semanal, sábado, 31 de março 2012

Dor e resiliência

A dor é universal. Todo mundo sabe o que é dor e já sofreu ou sofre hoje alguma experiência de dor, física, psicológica, moral, familiar e social. A resiliência é um conceito tirado da física. Quando alguns metais sofrem pressão e impacto, endurecem e ficam mais fortes. Não só resistem ao choque, mas saem fortalecidos. Essa descoberta ajudou psicólogos/as a compreenderem porque certas tragédias e perdas que, muitas vezes, fazem as pessoas perderem a vontade de viver, podem também, em outras ocasiões, torná-las mais resistentes e até mais fortes do que antes. A ciência ainda procura quais os fatores que propiciam as condições para homens e mulheres enfrentarem e superarem problemas que, em outros casos, os teriam feito sucumbir. Muitos concordam em citar a fé e a esperança como fatores que ajudam a resistência e mesmo a resiliência. Quando a fé e a esperança são assumidas não apenas como costume social ou convenção cultural, mas como atitude vital podem ser instrumentos de força e de renovação interior, mesmo no meio das mais duras aflições. A maioria das tradições espirituais tem em sua base a confiança de se saber amado/a. Esta convicção abre a pessoa crente a uma esperança maior que dá sentido à luta do dia a dia e propicia força interior para enfrentar as situações mais adversas.

Há anos e anos, as comunidades cristãs que vivem nos territórios palestinos, ocupados pelo Estado de Israel, se sentem entre dois fogos cruzados. São solidárias dos palestinos oprimidos em sua própria terra, mas convivem e colaboram com organizações judaicas que buscam a paz e a justiça. Em um recente documento intitulado Kairós, esses cristãos palestinos afirmam: “Apesar de que, na realidade política do nosso país, não vemos um único sinal positivo, a nossa esperança permanece forte. A situação atual não promete nenhuma rápida solução e não vemos quando será o fim da ocupação imposta sobre nós. Apesar disso, temos esperança, porque ela vem de Deus e ele nos dá forças para resistir ao mal”. É essa resistência ao mal que fez Jesus enfrentar pacífica, mas decididamente os seus adversários até o ponto de doar sua vida pela causa do projeto divino no mundo.

Algumas Igrejas cristãs guardam o costume de anualmente celebrar a memória do sofrimento, morte e ressurreição de Jesus. Esse memorial do que aconteceu com Jesus, revivido ritualmente em cada Semana Santa, não pensa que o sofrimento é bom e nem o justifica. Muito menos acredita que a morte de Jesus foi decisão ou vontade de Deus. Se fosse, este seria uma pessoa má. Jesus foi condenado e assassinado pelo império romano com a participação e o conluio de autoridades judaicas da época. A cada ano, as comunidades católicas, ortodoxas, anglicanas e de várias outras Igrejas celebram a Páscoa para proclamar que Deus libertou Jesus da morte. Ao ter assumido o seu sofrimento por amor e ter dado a vida para que se realize no mundo o projeto divino de um mundo transformado, recebeu uma vida nova que partilha conosco.

Este modo de viver não nos vacina contra o mal nem nos protege das dores e angústias da vida, mas nos dá a graça de viver cada dia de forma renovada e feliz, com uma força extraordinária para superar as dores e tragédias da vida. No próprio fato de celebrar a Páscoa, as pessoas encontram motivo e oportunidade de resiliência. São João Crisóstomo, bispo de Constantinopla, no século IV, afirmava: “A ressurreição de Jesus faz de nossas vidas, mesmo no meio da dor e das lutas, uma festa contínua”. 

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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