Estou aqui no Recife acompanhando minha irmã Penha que está se recuperando da cirurgia cardíaca. Tanto por isso, como para fazer novos exames de saúde (parece que estou com algum problema nos rins), tive de renunciar ao convite oficial do governo venezuelano para acompanhar como observador internacional as eleições presidenciais na Venezuela. Para me substituir, indiquei meu irmão e amigo Pedro Lapa e ele viajou. Fico contente por isso. Apesar de estar aqui, meu coração está lá porque estou convencido de que as eleições da Venezuela não são importantes só para os venezuelanos, mas para todos os latino-americanos que desejam que o processo bolivariano continue e se aprofunde. Estou totalmente de acordo com o artigo de um amigo que foi publicado no site do MCP:
A vitória de Hugo Chávez nas eleições do próximo domingo, na Venezuela, é a melhor solução para as três Américas, mesmo para os setores contrários à sua permanência por mais um mandato. Esta é, apesar do que diz a grande mídia, a maior garantia de estabilidade na região, pela abrangência e consistência das relações externas do vizinho país.
O jovem representante da velha elite venezuelana, Henrique Capriles, candidato de uma coligação direitista, de oposição, até cresceu um pouco nas pesquisas, mas em todas elas sua derrota é consagrada. Nos Estados Unidos, ele goza da simpatia tanto do também conservador Mitt Romney quanto do presidente Barack Obama, que estão de igual modo em processo eleitoral. Mas, junto ao povo é diferente, como revelam pesquisas.
Ao mesmo tempo, entre os 12 países do Unasul, o tratado da América do Sul, Capriles só conta com o apoio do governo golpista do Paraguai, contrário ao ingresso da Venezuela no Mercosul, fato contudo já sacramentado. Semana passada, ele chegou a fazer uma visita ao presidente Juan Manuel Santos, da Colômbia, mas não obteve seu apoio. Saiu de lá apenas com uma vaga promessa de neutralidade.
Santos leva em conta, porém, que a vitória de Chávez é fundamental para o sucesso de seu plano de paz com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Até porque a extensa fronteira de planície entre os dois países, apesar da floresta e das águas do rio Orinoco e do Cassiquiare, seu defluente e formador do Negro, é de livre circulação das Farc. Só Chávez pode ter algum controle.
Santos tampouco foi na conversa do venezuelano quanto à lisura do pleito de domingo. Além do mais, uma comissão do Unasul e emissários das Nações Unidas (ONU) estarão na Venezuela acompanhando todo o processo.
É claro que, do ponto de vista eleitoral, a questão internacional só interessa na medida em que influencie os 19 milhões de cidadãos e cidadãs venezuelanos que irão às urnas. Mas, também neste aspecto Chávez nada de braçadas. A maioria deles tem orgulho da postura altiva e independente adotada por seu líder, de combate à ganância das grandes potências e uso do petróleo para ajudar países pobres.
Essa questão soma-se, pois, às políticas adotadas por Chávez no plano interno, que já reduziu em quase 20% o número de famílias que vivia abaixo da faixa de pobreza. Sem contar a verdadeira revolução que fez nas áreas de educação e saúde. Hoje, o atendimento de saúde no país, em grande parte domiciliar, chega aos mais remotos rincões.
Nesse aspecto, aliás, também há reflexos da política internacional. A cooperação de Cuba, que ajudou a implantar o programa de saúde hoje em vigor na Venezuela, é uma retribuição ao apoio econômico de Chávez, em especial com o fornecimento de petróleo subsidiado. O apoio cubano se deu especialmente com o envio de milhares de profissionais do setor, em boa parte médicos, para atuarem na Venezuela.
Também veio de Cuba o apoio técnico para mudanças radicais no campo dos esportes venezuelanos. A começar pelo beisebol, o esporte nacional de ambos os países. Mas é visível também nos esportes olímpicos em geral, o que é demonstrado pelo número de medalhas em competições internacionais, e até mesmo no futebol, em que a Venezuela não tinha nenhuma tradição. E dessas coisas eleitor nenhum se esquece.
Na prática, ficou difícil para Capriles arranjar argumentos contra Chávez, a não ser aqueles que a grande mídia internacional, em particular a dos EUA, já usa há anos. Essa mídia, aliás, é órfã da Guerra Fria e escolheu o mandatário venezuelano para o posto de inimigo número 1 do capitalismo. Mas, para isso, o acusa de mundos e fundos, puras invenções, e a verdade que se lixe.
As forças imperialistas, ou neocolonialistas, terão agora que admitir que Hugo Chávez conseguiu rimar democracia com soberania em seus governos. Por essa razão serve de exemplo mundo afora. As políticas de redução das enormes diferenças entre ricos e pobres naquele país, com justiça social, são apenas parte de um processo amplo e definitivo. E isso é o que as enraivece.
O fato é que, juntas com as elites locais, essas forças verão as três Américas aplaudires os resultados das urnas, o que será muito bom para todos.
Artigo de Jaime Sautchuk. Trabalhou nos principais órgãos da imprensa, Estado de SP, Globo, Folha de S.Paulo e Veja. E na imprensa de resistência, Opinião e Movimento. Atuou na BBC de Londres, dirigiu duas emissoras da RBS.