Queridos irmãos e irmãs,
O Cristo ressuscitou e a partir daí, toda partida se torna Páscoa e encantamento.
Neste dia, ao pensar na Páscoa do Papa Francisco, diversos sentimentos me vêm ao coração.
Nesse momento de despedida, eu e muitos de vocês temos a sensação de ter perdido alguém próximo a quem conhecemos pessoalmente e com o qual convivemos, como no cotidiano da vida.
Antes de tudo, damos graças a Deus pelo testemunho evangélico de Francisco, por tentar, o mais possível, humanizar o Vaticano e a Igreja. Gratidão, principalmente, por ter tentado revalorizar as Igrejas locais e proposto a sinodalidade como modo normal de toda a Igreja ser.
Será necessário um tempo maior para avaliar o quanto o Papa Francisco conseguiu renovar as estruturas e tocar nas mentes e corações das pessoas. Talvez se possa dizer dele o que, conforme os evangelhos, os guardas do templo disseram de Jesus, ao explicarem aos chefes, porque não o tinham prendido: “Nunca, ninguém falou como esse homem” (Jo 7, 46).
Do mesmo modo que ocorreu com Jesus, o Papa Francisco foi um profeta que falou ao coração de muita gente do mundo. No entanto, nos ambientes eclesiásticos, ainda há muita gente importante que sente, como aquele padre que, já há alguns anos, confidenciou à imprensa: “matar o papa é pecado, mas rezar para que ele morra, não é”.
A extrema polaridade que divide hoje o mundo não entre direita e esquerda, mas entre civilização humana e barbárie, fere profundamente a Igreja Católica e outras Igrejas.
Mesmo entre nós, há irmãos que não se dão conta de que a contradição é estrutural e diz respeito ao modelo de Igreja que é vivido. O papado e a Catolicidade como existe hoje é continuidade de uma organização eclesiástica que vem da Idade Média e insiste em continuar assim, mesmo depois de todas as mudanças do mundo atual. Mesmo depois de todas as mudanças feitas pelo Papa Francisco, o Estado do Vaticano é a única monarquia absoluta do Ocidente. Como diz o evangelho: “não adianta remendo novo em roupa velha. Para vinho novo, são necessários barris novos” (Mc 2, 22).
Então, não basta nos perguntarmos o que podemos esperar ou desejar do próximo papa. A partir da experiência do Papa Francisco e do seu quase nenhum êxito nos ambientes do clero, é necessário perguntar-nos é possível ter um Papa sem ser no modelo de Igreja-Cristandade como religião civil, se, para cumprir a missão de primaz das Igrejas, o papa pode continuar sendo chefe de Estado e como seria a função do Bispo de Roma como primaz da comunhão das Igrejas locais em uma futura Igreja realmente sinodal.
Que do céu, o Papa Francisco, a partir da pesada cruz que ele viveu em seu ministério, interceda por nós para sabermos ser fieis ao Evangelho de Jesus e ao seu projeto no mundo.