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Chamado e ensaio da novidade

III Domingo comum: Mc 1, 14- 20. 

Chamado, rompimento e ensaio da novidade

                   Neste III Domingo comum do ano, começamos a seguir como o evangelho de Marcos introduz a ação de Jesus na Galileia. Diz que Jesus começa a sua ação profética, depois que João Batista foi preso. Prendem um profeta, mas não conseguem prender a profecia. E Jesus anuncia a boa notícia de Deus: “Completou-se o tempo. O reino de Deus, ou seja, o projeto ou programa que Deus tem para o mundo, está chegando. Mudem de vida e acreditem nesta boa notícia”.  

Para os contemporâneos de Jesus, essa palavra significava que tinha chegado a hora de acontecer aquilo que era objeto da esperança messiânica:  a libertação integral do povo e o reinado divino sobre o mundo. 

É possível que, para as comunidades para as quais, nos anos 70, o evangelho de Marcos foi escrito, esse mesmo anúncio tenha tomado outro conteúdo. Os romanos tinham destruído Jerusalém, com o seu templo e tinham dominado a rebelião judaica. Diferente da época de Jesus, a esperança de libertação já não tinha mais como ser nacional. Em tal contexto, a tentação das comunidades cristãs será a de interpretar o reino de Deus como algo espiritual que ocorre apenas no coração das pessoas. O evangelho de Marcos mostra que, mesmo se não é nacional e apenas político, o projeto divino é de transformação (metanoia) radical e profunda das pessoas e do mundo. Trata-se de uma nova ordem política a qual Jesus pede que as pessoas aceitem aderir (crer). 

Para começar sua ação, Jesus vai a Galileia, a região mais pobre, mais rural e mais culturalmente misturada. A tradição judaica a chamava de “terra de pagãos”. É ali no meio dos mais pobres, na região na qual se tinha criado, que Jesus chama seus primeiros discípulos.  Ele os chama na beira do mar. Para a Bíblia, o mar representa o desconhecido, o perigo já que as naves inimigas vinham pelo mar. É verdade que o mar da Galileia ou de Tiberíades é mais um lago do que um mar e é interno ao país. Mas do outro lado do lago, é região estrangeira e é nessa fronteira para o desconhecido que Jesus chama seus primeiros discípulos. O evangelho salienta como ele toma a iniciativa de ir ao encontro das pessoas comuns e que estão em sua vida normal e seu trabalho. Jesus vai encontrar cada um no seu lugar de inserção social e de trabalho cotidiano. É ali que Ele os chama. O evangelho fala pouco sobre os discípulos escolhidos. O mais importante é ter sido chamado. Simão e André lançavam as redes ao mar, quando Jesus os chamou. Já Tiago e João consertavam as redes quando foram chamados. 

Possivelmente, a expressão de Jesus “farei de vocês pescadores de homens” vem do profeta Jeremias e de acordo com o profeta, essa expressão tinha um conteúdo de julgamento dos ricos que seriam pescados como com anzóis. Portanto, originalmente “pescar homens” aludia à intervenção divina para transformar a sociedade. 


O evangelho diz que, ao chamado de Jesus, os discípulos abandonam as redes e o pai. Isso significa renunciam à sociedade de trabalho, na qual estavam inseridos e à família. Não se trata de deixar a família para se isolar ou simplesmente para negar a realidade e sim para transformá-la. Serão pescadores de gente no sentido reunir as pessoas todas no julgamento final, como a colheita da plantação. É a imagem do reinado divino que começa. 

O discipulado de Jesus começa por essa cena em que, de dois em dois, seguem Jesus. Para o evangelho, seguir significa não apenas acompanhar o Mestre, mas assumir o caminho que ele toma. Para os discípulos, esse caminho será exigente e radical, porque implica na cruz. 

Para nós, hoje, sermos, hoje, discípulos e discípulas de Jesus significa não apenas pertencer a uma Igreja, frequentar cultos ou mesmo crer em doutrinas. É principalmente assumir a causa do reino de Deus no mundo. Viver os valores do reino e testemunhar a entrega de nossas vidas para que a Justiça ecossocial e a Paz que o reino significa penetrem nas estruturas da sociedade e na nossa forma de viver. 

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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