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Conversa, sexta feira, 13 de junho 2014

Dia cheio e cansativo e o olho esquerdo, operado a três dias, ainda incomoda. Comecei a manhã por uma visita a irmã Escobar. Aos 94 anos, está em uma casa de irmãs idosas das Doroteias no Recife. Embora a memória vá e volte a todo momento, quase sempre está lúcida. Sempre foi um luzeiro de inteligência e criatividade. Agora, me diz: "já não tenho mais a mesma cabeça de antes e tenho de aceitar isso e confiar em Deus". Mas, cada vez que a encontro, fico impressionado com a bondade fundamental com a qual ela olha tudo e todos. O lugar em que a colocaram é ótimo, as irmãs são maravilhosas e a tratam de uma forma carinhosíssima, a saúde está o melhor possível, a alegria dela de ter missa diária é permanente. Enfim, com um olhar positivo assim, enfrenta bem as dificuldades e é muito mais fácil para todos que têm de lidar com ela. Acompanho assim outra pessoa (um homem) que é exatamente o oposto. Ele foi a pessoa que mais sofreu na vida, todo dia constata a maldade do ser humano, os amigos o decepcionam sempre e assim por diante. O que dizer? Mude seus óculos. Olhe as coisas de outra forma?

Estou devorando o quarto volume do 4° tomo das cartas circulares de Dom Helder Câmara. Agora estou lendo as de 1969 a 1970. Tempo duríssimo da ditadura militar. Ele sofria todas as ameaças e repressões do governo, mas também pressões injustas e violentas do Vaticano e de muitos de seus irmãos bispos. Em 1969, estava em plena força da sua inteligência, aos 60 anos. Tinha convites para falar no mundo inteiro e sentia isso como uma vocação sua e um modo de colaborar com a causa do reino. Mas, o Vaticano exigia que para cada viagem, ele tivesse de pedir permissão ao bispo local (para falar em sua diocese) e ao núncio do país. Um absurdo. E ele acabava se submetendo a isso e mesmo com todo o sofrimento vivia feliz sua missão e em profunda comunhão com o papa e com toda a Igreja.

Hoje, eu seria bem mais crítico e menos dócil. No entanto, percebo que do modo dele, ele fez mais bem e conseguiu mais coisas do que se tivesse assumido mais o conflito. 

Deus nos ajude no discernimento do que é correto como forma de ação hoje.  

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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