Hoje participei pela manhã da assembléia arquidiocesana de pastoral. Muita gente e de fato muitos leigos e leigas. É bom ver uma Igreja em busca e aberta à missão, grande tema da assembléia. O coordenador de pastoral explicou que a opção foi construir juntos todo o plano de pastoral. Que bom. Deus seja bendito por essa opção. Ali eu vi padres de movimentos espiritualistas de hoje como "Arautos do Evangelho", pessoal carismático e outros. Vi um padre casado que acompanha a pastoral da saúde e quis ver alguém mais ligado às pastorais populares, como dos lavradores, dos operários, etc... Encontrei um casal histórico do "Encontro de irmãos", grande movimento de evangelização do tempo de Dom Hélder. Se eu puder, quero colaborar para que essas pessoas possam de novo sentir-se em casa nas reuniões da nossa Igreja.
Em uma breve intervenção, recordei que hoje é aniversário do dia em que mais de cem bispos, liderados por Dom Hélder, em Roma, durante o Concílio, em 1965 (há 47 anos), assinaram o chamado "Pacto das Catacumbas", um documento que se tornou como o documento do Concílio Vaticano II, embora não tenha sido um documento do concílio, sobre a Igreja dos pobres.
Para nós do Recife, essa data tem um significado ainda mais simbólico porque, nesse dia, o nosso irmão padre João Pubben, profeta de Deus e amigo dos pobres, deixou a Bélgica em um navio e veio para o Brasil, onde está até hoje, no serviço ao reino de Deus acontecendo no meio dos pequeninos. Parabéns.
Em homenagem a ele e para nos ajudar a "retomar o primeiro amor", como diz o Apocalipse, quero reproduzir aqui o documento assinado nesse dia (em 1965) em uma catacumba romana por Dom Hélder Câmara e 126 bispos do mundo inteiro:
Pacto das Catacumbas
As treze resoluções de bispos anônimos
“Nós, bispos, reunidos no Concílio Vaticano II, esclarecidos sobre as deficiências de nossa vida de pobreza segundo o Evangelho, incentivados uns pelos outros, numa iniciativa em que cada um de nós queria evitar a singularidade e a presunção, sobretudo com a graça e a força de nosso Senhor Jesus Cristo, com a oração dos fiéis e dos sacerdotes de nossas dioceses, na humildade e na consciência de nossa fraqueza, mas também com toda a determinação e com toda a força de que Deus nos quer dar a graça, comprometemo-nos com o que segue:
1 - Procuraremos viver segundo o modo ordinário da nossa população, no que diz respeito à habitação, à alimentação, aos meios de locomoção e a tudo o que daí se segue. Cf. Mt 5, 3; 6, 33- 34; 8, 20.
2 - Renunciamos para sempre à aparência e à realidade da riqueza, especialmente no traje, (tecidos ricos, cores berrantes), nas insígnias de material precioso (devem esses signos ser, de fato, evangélicos). Cf. Mc 6, 9; Mt 10, 9- 10; At 3, 6. Nem ouro nem prata.
3 - Não possuiremos nem imóveis, nem móveis, nem contas em banco, em nosso próprio nome, e se for preciso possuir, poremos tudo em nome da diocese, ou das obras sociais e caritativas. Cf. Mt 6, 19- 21; Lc 12, 33- 34.
4 - Cada vez que for possível, confiaremos a gestão financeira e material em nossa diocese a uma comissão de leigos competentes e cônscios do seu valor apostólico, em mira a sermos menos administradores do que pastores e apóstolos. Cf. Mt 10, 8; At 6, 1- 7.
5 - Recusamos ser chamados, oralmente ou por escrito, com nomes e títulos que signifiquem a grandeza e o poder (Eminência, Excelência, Monsenhor...). Preferimos ser chamados com o nome evangélico de irmãos. Cf. Mt 20, 25- 28; 23, 6- 11; Jô 13, 12- 15.
6 – No nosso comportamento, nas nossas relações sociais, evitaremos aquilo que pode parecer conferir privilégios, prioridades ou mesmo uma preferência qualquer aos ricos e aos poderosos (ex: banquetes oferecidos ou aceitos, classes nos serviços religiosos). Cf. Lc 15, 9- 13; 2 Cor 12, 4.
7 - Do mesmo modo, evitaremos incentivar ou lisongear a vaidade de quem quer que seja, com vistas a recompensar ou a solicitar dádivas, ou por qualquer outra razão. Convidaremos nossos fiéis a considerarem suas dádivas como uma participação normal no culto, no apostolado e na ação social. Cf. Mt 6, 2- 4; Lc 15, 9- 13; 2 Cor 12, 4.
8 - Daremos tudo o que for necessário de nosso tempo, reflexão, coração, meios, etc., ao serviço apostólico e pastoral das pessoas e dos grupos laboriosos e economicamente fracos e subdesenvolvidos, sem que isso prejudique as outras pessoas e grupos da diocese. Ampararemos os leigos, religiosos, diáconos ou sacerdotes que o Senhor chama a evangelizar os pobres e operários pela participação e partilha na vida operária e no trabalho. Cf. Lc 4, 18- 19; Mc 6, 4; Mt 11, 4- 5; At 18, 3- 4; 20, 33- 35; 1 Cor 4, 12 e 9, 1- 27.
9 - Cônscios das exigências da justiça e da caridade, e das suas relações mútuas, procuraremos transformar as obras de “beneficiência” em obras sociais baseadas ba caridade e na justiça, que levam em conta todos e todas as exigências, como um humilde serviço dos organismos públicos competentes. Cf. Mt 25, 31- 46; Lc 13, 12- 14 e 33- 34.
10 - Poremos tudo em obra para que os responsáveis pelo nosso governo e pelos nossos serviços públicos decidam e ponham em prática as leis, as estruturas e as instituições sociais necessárias à justiça, à igualdade e ao desenvolvimento harmônico e total do ser humano todo e de toda a humanidade, e, por aí, ao advento de uma outra ordem social, nova, digna dos filhos e filhas de Deus. Cf. At 2, 44- 45; 4, 32- 35; 5, 4; 2 Cor 8 e 9 inteiros, 1 Tm 5, 16.
11 – Pelo fato de que compreendemos a colegialidade dos bispos como a realização mais evangélica da missão, sentimos que devemos assumir o encargo comum das massas humanas em estado de miséria física, cultural e moral – dois terços da humanidade. Por isso, nos comprometemos:
- a participar, conforme nossos meios, dos investimentos urgentes dos episcopados das nações pobres;
- a requerer, junto ao plano dos organismos internacionais, mas tessemunhando o Evangelho, como fez o papa Paulo VI na ONU, a adoção de estruturas econômicas e culturais que não mais fabriquem nações proletárias num mundo cada vez mais rico, mas sim permitam às massas pobres saírem de sua miséria.
12 - Comprometemo-nos a partilhar, na caridade pastoral, nossa vida com nossos irmãos em Cristo, sacerdotes, religiosos e leigos, para que nosso ministério se constitua como um verdadeiro serviço; assim:
- esforçar-nos-emos para “revisar a nossa vida” com eles;
- suscitaremos colaboradores para serem mais animadores segundo o espírito, do que chefes segundo o mundo;
procuraremos ser mais humanamente presentes e acolhedores…
- mostrar-nos-emos abertos a todos, seja qual for a sua religião. Cf.
13 – Tornados às nossas dioceses respectivas, daremos a conhecer aos nosso diocesanos a nossa resolução, pedindo-lhes que nos ajudem por sua compreensão, sua colaboração e suas preces.
Que Deus nos ajude a sermos fiéis” [1].
[1] - Cf. Texto Integral na Revista Concilium/ 124 – 1977/ 4: Teologia Prática, p. 118- 120.