Estou voltando da 8a Caminhada dos Terreiros de Pernambuco. É um evento que reúne comunidades e lideranças de comunidades religiosas afrodescendentes de Pernambuco, mas principalmente do Recife. Começa no Marco Zero, em frente ao mar e depois de um momento de falas e de culto, se encaminham a pé até a Praça do Carmo, onde se encerra a caminhada diante da estátua do Zumbi dos Palmares, líder negro do século XVII que liderou os quilombos para libertar os escravos e que teve sua cabeça decepada e fixada em um poste nessa praça.
É o segundo ano em que participo da caminhada e fico feliz de dar esse sinal de comunhão e solidariedade com o povo negro. Dessa vez, disseram-me que havia ali umas três mil pessoas. É bonito e importante ouvir a voz dos que, por tantos séculos, não puderam falar. Desejo profundamente que essa caminhada se firme como evento anual e, a cada ano, tenha mais êxito.
Ainda me impressiona o fato de que a imensa maioria das falas é de caráter defensivo e como reivindicação dos direitos das religiões negras de existirem e se manifestarem. Todo dia, ainda ocorre, no Recife e em outras cidades, fatos que mostram discriminação e perseguição aos cultos afro. Por isso, essa caminhada ainda tem muito um caráter de legitimação. Não gosto do fato de que, acriticamente, eles valorizam todas as autoridades (municipais e estaduais) que acabam se aproveitando do apoio dessas comunidades negras mais do que lhes dando apoio. E parece que os responsáveis do Candomblé, Umbanda e Jurema não percebem isso.
Também sinto que falta um aprofundamento maior das bases da fé e da espiritualidade. É como se fosse um festival de exterioridades. Se fosse uma procissão católica ou um evento do clero católico, não seria diferente. No entanto, sinto que, enquanto as religiões não conseguirem ultrapassar o nível da excentricidade (muita roupa vistosa, muita lantejoula e muitos tiques "religiosos" não bastam para formar um evento de fé. Ali eu senti a fé viva e profunda em muitos dos pais e mães de santo que falaram, cantaram e participaram do Xiré, mas, ao olhar aquele desfile de roupas excêntricas e diferentes, penso na minha Igreja e sonho com o dia em que voltemos à simplicidade dos nossos pais e mães fundadores. Que o antigo escravo possa sentir-se respeitado como ele é, negro e pobre e não precise de vestir-se de senhor ou senhora de engenho do século XVII para se pensar de Deus. Como o sacerdote católico deveria libertar-se dos paramentos dos sacerdotes do rito pagão da religião romana e voltar ao Evangelho.