Hoje, se completam dois anos da eleição do papa Francisco como bispo de Roma e patriarca das Igrejas de comunhão latina. Soube que um amigo lhe perguntou como se sentia ao celebrar esses dois anos de ministério papal. Ele respondeu: "Estou vivo". Isso me parece dizer muito. Ele sobreviveu. Tomara que sobreviva ainda alguns anos. Hoje, no jornal "La Repubblica", um dos mais importantes jornais da Itália, saiu um artigo de Vitor Mancuso, teólogo leigo, (amigo e companheiro de caminho). Ali ele escreve que os cardeais, tanto da Cúria, como os bispos que no mundo todo, resistem ao papa e são contrários ao seu projeto de reforma da Igreja não percebem que se esse projeto falhar, será difícil a Igreja Católica recuperar a credibilidade da maioria da humanidade que justamente percebeu a crise anterior e aposta na proposta do papa.
Na basílica superior de Assis, há um afresco de Giotto (século XIV) que mostra o papa Inocêncio III vendo em sonho uma Igreja ruindo e um pobre frade sustentando e levantando o edifício que desabava. Atualmente, um outro Francisco, não mais o pobre frade e sim o próprio papa tenta levantar uma Igreja que caía nas malhas de muitos escândalos financeiros, morais, sociais (de luta pelo poder) e políticos (de relação com poderosos que eram ou são bons católicos como Berlusconi, Pinochet e companhia).
Até agora, Francisco não faz essa reforma simplesmente fazendo uma nova teologia ou discutindo dogmas ou citando documentos. O que mais caracteriza sua profecia são gestos. E nesses gestos, ele indica um rumo, ele mostra um caminho. O fato de ter feito sua primeira saída do Vaticano para a ilha de Lampedusa se solidarizar com os migrantes africanos mortos ou expulsos da Europa foi um gesto que pede interpretação. O fato de na 5a feira santa do ano passado ter deixado o Vaticano e ter ido celebrar a Missa da 5a feira santa em uma casa de correção de menores na periferia de Roma mostra um rumo e mais ainda pelo fato de que, naquela missa, ele lavou os pés não de doze cardeais (No Vaticano, a cada ano, havia uma verdadeira luta surda entre cardeais que se colocavam no número dos príncipes da Igreja que teriam seus pés lavados pelo papa). No ano passado, o papa decidiu, fora de todos os costumes vigentes no Vaticano, fazer esse rito fora do Vaticano, com doze pessoas pobres, entre os quais algumas mulheres (era a primeira vez e muitos disseram: Mas, Jesus lavou os pés de doze apóstolos, todos homens!) e entre os doze haviam dois ou três migrantes e que nem eram cristãos. Eram (são) muçulmanos. O papa explicou pouco porque fez assim. Deixou que outros fizessem a exegese.
Contaram-me que na Itália há um cômico de televisão que imita todo mundo e imita também o papa. E em uma das emissões, ele imitou o papa carregando nos ombros uma senhora pobre que encontrou caída na rua. E no quadro televisivo, o cômico mostra os cardeais aplaudindo entusiasticamente o gesto do papa (era o que se esperava dele), mas o cômico mostra o papa já velho, cansado e incapaz de manter-se carregando sozinho aquele corpo sobre os ombros e o fato é que nenhum dos cardeais se oferece para ajudá-lo. Penso que essa cena diz muito ao mundo. Não basta aplaudir o papa. É preciso pensar como nas bases e em nossa realidade de vida podemos colaborar com a proposta de reforma da Igreja que ele faz e que gestos proféticos podemos todos nós fazermos para dar base aos gestos de Francisco.