XIV Domingo Comum: Mt 11, 25- 30.
Deus toma partido na luta de classes e aí Jesus nos chama
Neste XIV Domingo comum do ano A, o evangelho é dos textos mais queridos do Novo Testamento: Mateus 11, 25- 30. Conforme Mateus, Jesus tinha acabado de ser rejeitado pelas cidades do lago da Galileia. Tinha descoberto que, ali, sua missão falhou. Nos versículos anteriores, ele pronuncia uma advertência profética contra Cafarnaum, Corazaim e outras cidades.
Em seguida, o evangelho mostra que, no lugar de ficar deprimido e se sentir fracassado, Jesus agradece ao Pai o que tinha acabado de viver. Conforme Mateus, esta é a única oração pessoal e íntima de Jesus ao seu Pai, que o evangelho retrata, antes da noite na qual seria preso. É uma oração de louvor e bênção. Nela, Jesus interpreta o fracasso que sofreu.
Naquela primeira etapa de sua vida pública, Jesus pensou que poderia pregar o reino de Deus de forma igual para todos. Até hoje, ainda há padres e pastores que pensam assim. No entanto, já na sociedade da época de Jesus, havia interesses de classe que não permitiam aos ricos e cidadãos das cidades, ligados ao império romano aceitar a profecia do evangelho.
Até hoje, não são muitas as pessoas que se colocam na posição de quem deseja que o reinado divino da justiça e da libertação chegue para o mundo. Por isso, Jesus fracassou na Galileia e chega a agradecer a Deus o fracasso, porque aprendeu que o conflito de classes existe. Deus não criou o conflito de classe, nem gosta dele. Mas, como é Amor, fica obrigado a entrar e tomar partido a favor de quem está injustiçado.
Jesus descobriu isso, sofrendo na própria pele. Descobriu que Deus decidiu revelar os seus segredos ao pessoal pobre e indefeso. Os segredos do reino são tão significativos e desafiadores que as pessoas de classe dominante ficam confundidas e cegas pela luz da vida que não conseguem realmente ver e entender. Jesus tinha ensinado os discípulos a chamarem a Deus de “Pai”. Agora, pela primeira vez, é ele mesmo que o chama assim. Chama-o em aramaico “Abba”, modo carinhoso com o qual os filhos chamavam o pai ou alguém mais velho e muito querido. Nada de religioso ou sagrado. É o modo de falar da linguagem comum.
Em geral, todos gostam do fato de Jesus agradecer ao Pai por ter revelado o segredo da vinda do reino aos pequeninos. No entanto, poucos entendem o fato de que, ao mesmo tempo que revela os seus segredos às pessoas consideradas sem importância, Deus os esconde dos grandes e entendidos. Não é fácil compreender que o amor universal de Deus só é verdadeiramente para todos, se tomar partido pelos injustiçados.
Nesta oração, Jesus repete a experiência de Daniel na Babilônia que agradece a Deus o fato dele ter revelado os seus segredos a ele, pequeno e pobre e não aos sábios da corte (Cf. Dn 2, 23). Jesus agradece ao Pai pela revelação que o Pai dá aos pequeninos: os pescadores, operários e marginalizados que o acolheram e o seguem pela Galileia. É, ao lado dos pequenos e esmagados pelo sistema, que Jesus faz um novo chamado ao discipulado. Antes, ele tinha chamado cada um/uma dos seus discípulos/as, de modo particular (Vem e segue – me). Agora, chama coletivamente todas as pessoas, aprisionadas ao jugo do império e curvadas sob o peso de opressões.
Muitos comentários deste evangelho interpretam que, quando fala de jugo, Jesus se referia ao peso da lei judaica e suas 260 prescrições. No entanto, essa interpretação parte de preconceito. Para Jesus e para a mística judaica, a lei de Deus nunca é opressiva. Nunca é jugo pesado. O salmo 19 canta: “A tua lei, Senhor, é liberdade”. O salmo 119 diz: “É luz, farol para os meus passos..”.
A lei de Deus só se transforma em jugo quando é usada pela religião para dominar as pessoas em nome de Deus, ou quando o Catolicismo ou o Pentecostalismo a leem de modo literal e a usam em campanhas moralistas para satisfazer preconceitos e tabus sexuais de religiosos rígidos e preconceituosos. No mundo de Jesus, a lei tinha se tornado jugo na forma da religião do templo, a serviço dos dominadores romanos. Para Jesus, o jugo é o império e a religião que o legitima.
Até hoje, a direita política que mais oprime o mundo usa a moral religiosa para ter o apoio de ministros e comunidades de fé. Infelizmente, até hoje, há cardeais e bispos que se colocam a favor de determinados políticos que representam o que há de mais opressivo e contra a vida. Basta que esses políticos se manifestem contra o aborto e o casamento gay. Quem defende a lei moral desta forma absoluta e isolada do seu contexto social e político não compreendeu o jugo suave e leve de Jesus.
O chamado de Jesus: Vinde a mim, vós todos que estais sobrecarregados foi dirigido às pessoas oprimidas, lavradores sem-terra, índios, negros, minorias sexuais e todos/as os/as oprimidos do mundo. Se Jesus os chamou e chama a mim, à medida que vou a Jesus, os encontro todos em Jesus. Jesus aprendeu com o Pai a estar sempre com eles e elas.
Os pequeninos aos quais Deus revela os seus segredos são os pobres e iletrados, tocados pelo amor do Pai. São os empobrecidos que estão dentro dos movimentos sociais e de organizações que os ajudam a se situar na vida como depositários do segredo do reino. Os pequeninos aos quais Jesus chama não são as massas que votam na extrema-direita. Portanto, não basta ser pobre. Conforme Lucas, Jesus disse: Bem-aventurados vocês, pobres!(Lc 6, 22). Mateus corrigiu que Jesus se referia aos pobres que assumem a condição de pobres (pobres em espírito – Mt 5).
Falar do jugo de Jesus pode ser referência ao peso de uma ética nova e radical a qual, de certa forma, nos obrigamos. Jesus nos ensina e espera de nós um projeto de vida radical e diferente. Só na perspectiva do bem-viver indígena ou do Ubuntu do povo zulu (eu sou porque você é. Se você não é, eu não sou), só nesta perspectiva revolucionária, podemos eu e todos sermos felizes. Neste momento em que enfrentamos tantos pesos e riscos, alegremo-nos de ouvir para cada um/uma de nós a palavra: Venham a mim, vocês que estão sobrecarregados/as e encurvados sob o fardo. Em mim vocês encontram alívio, repouso e consolação.
" Oração dos índios Lakota (EUA):
em minha mente, em minha intuição, em minha sabedoria interna,
nos sentidos de meu corpo, nas bênçãos do meu espírito.
e amar, além do meu medo, e assim, caminhar com Beleza com a passagem de cada Sol glorioso.