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Fim de um mundo, começo de outro

Fim de um mundo, começo de outro

                Neste 33º domingo comum, o penúltimo do ano litúrgico, o papa Francisco propõe que seja “o dia mundial dos pobres”. O evangelho lido nas comunidades é Marcos 13, 24 a 32, um trecho do famoso discurso de Jesus sobre o que popularmente se costumou chamar o “fim do mundo”. 

Em nossos dias, a palavra da sabedoria nos vem de parentes como Davi Kopenawa com o seu livro “A queda do céu” e Ailton Krenak com suas “Ideias para adiar o fim do mundo”. Nestes dias, a Conferência da ONU sobre mudanças climáticas em Glasgow se encerrou nesta sexta-feira, sem nenhuma proposta concreta para adiar o fim do mundo e deter o aquecimento global. Os governantes e representantes das empresas ali reunidos optaram mesmo por manter os seus lucros e interesses. 

Nos anos 70 do primeiro século da nossa era, as comunidades de discípulos e discípulas de Jesus estavam perturbadas e assustadas. A guerra do império romano contra os judeus tinha provocado a morte de muita gente, a destruição de Jerusalém e do seu templo. Para a fé judaica, isso punha por terra não apenas a esperança de libertação e independência do povo, mas contradizia todas as promessas de Deus. Como falar em aliança de Deus com o seu povo se este continuava escravo e nem mais tinha direito a viver em sua terra e a praticar a sua fé? 

Para as comunidades cristãs, vindas do Judaísmo, essa crise de fé era pesada. Por isso, o evangelho de Marcos recolhe palavras de Jesus que ajudem a comunidade a compreender melhor a realidade e retomar a esperança. 

Atualmente, a ameaça que pesa sobre o mundo é a destruição da vida no planeta. As mudanças climáticas não vêm de Deus e não são da vontade de Deus. Como a crise imensa pela qual passavam as comunidades cristãs nos anos 70 do primeiro século, quando foi escrito o evangelho de Marcos também não era. A grande questão do evangelho de hoje é como nessa situação de crise e de ameaça à vida encontrar esperança de salvação. 

O trecho do evangelho lido hoje diz que a própria natureza se abala. E naquela época, os astros são símbolos dos poderes humanos e políticos. O evangelho diz que há uma situação de crise e é preciso ler bem o que está acontecendo. Na recente mensagem que o papa Francisco enviou aos/às representantes dos movimentos populares, ele afirma: Vocês me ensinam a olhar a história a partir de baixo. O evangelho de hoje pede isso: reinterpretar a história a partir dos pequenos. Acho que essa é a melhor tradução para a figura do Filho do Homem que na Bíblia aparece nas profecias de Ezequiel e no livro (apocalipse) de Daniel. A figura de um deus humanizado que era comum entre os cananeus e na Babilônia foi se tornando a expressão comum das línguas antigas: o modo de particularizar uma espécie. O filhote de Leão significa um animal particular da espécie leão. O filho do homem é alguém que assume em si o fato simples de ser humano. De um lado é essa figura e esse título que Jesus assumiu para si e como juiz da história, mas do outro significa que ele é imagem e modelo de uma nova humanidade. Mesmo dos escombros de um mundo que parece desmoronar, surge a promessa da vinda do novo ser humano representado por Jesus. Sendo como Jesus e assumindo ser presença dele no mundo, nós juntos e juntas, como comunidade, seremos esse filho ou filha do humano que resgatará o mundo e iniciará uma história nova. 

Na mensagem para o dia mundial dos pobres deste ano, o papa recordou a palavra de Jesus: Pobres sempre tereis convosco e propõe não somente a ajuda mas a partilha. 

No evangelho de hoje, Jesus manda aprender a lição da figueira. No capítulo 11 ele tinha lançado uma maldição profética sobre a figueira, árvore que simbolizava a religião ritual do templo e que não produzia mais frutos. Agora, nesse texto, ele diz que as folhas novas na figueira anunciam uma nova estação. Isso quer dizer que a comunidade do evangelho podia se beneficiar de uma vitalidade nova, mesmo depois da crise terrível pela qual passava. Assim também, as crises e problemas que sofremos podem ser como folhas novas que anunciam que a vinda do projeto divino está muito próxima (o evangelho diz às portas).  

Em nossos dias, o protagonismo da juventude nos movimentos sociais e ecológicos, a nova articulação dos povos originários e o diálogo dos diversos setores da sociedade civil são como as folhas da figueira, sinais de que se aproxima a nova estação da vida e que podemos olhar não no céu mas na terra a figura da Nova Humanidade prefigurada no Cristo que vem e nos chama hoje para segui-lo neste novo caminho de construção do projeto divino.  

  

 

 

 

 

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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