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Meditação bíblica, domingo, 03 de agosto 2014

Conversa sobre Mt 14, 13- 21), o evangelho desse domingo

Assim que os discípulos de João lhe dão a notícia da morte de João  Batista, Jesus se retira para o deserto para viver um tempo de clandestinidade. O texto utiliza dez vezes o verbo “retirar-se”, sempre quando se trata de perseguições, como quando Herodes, pai de Herodes Antipas, ameaça  o menino e José foge com o menino para o Egito. Só que mesmo na crise de vida e na clandestinidade do deserto, Jesus encontra a multidão (gente também marginalizada) e acaba oferecendo um novo maná do deserto (como em Ex 16). Jesus é o enviado que revela a misericórdia e a compaixão de Deus que acolhe o povo faminto e o alimenta, além de curá-lo. O motivo de tudo é a “compaixão” (literalmente: amor que vem do útero).  Mateus conta que, no deserto, Jesus providencia comida para o povo faminto. É um banquete contrário ao banquete de Herodes do qual o evangelho fala no começo desse capítulo. O primeiro foi um banquete elitista e centrado na exclusão das pessoas e até na morte, no assassinato do profeta. O banquete de Jesus retoma o gesto divino de alimentar o povo bíblico no deserto.

O texto não fala em “multiplicação” de pães. É um fato tão importante para as comunidades que os Evangelhos guardaram seis relatos do mesmo fato: duas em Mateus e duas em Marcos, uma em Lucas e uma em João.

O relato não se centra em detalhes sobre como a cena aconteceu. Historicamente, é muito provável que, como explicam alguns[1], o “milagre” de Jesus tenha sido fazer com que alguém que tinha muito pouco (cinco pães e dois peixes) tenha aceitado pôr esse pouco que tinha à disposição de todos. Vendo isso, certamente outros fizeram o mesmo. Quando compartilhado, o pouco deu para todos e ainda sobrou.   

O evangelho se preocupa mais em aprofundar o significado dessa história. Mateus a conta a partir do texto bíblico que narra que o profeta Eliseu distribuiu pão para seus discípulos (Cf. 2 Rs 4, 42 - 44). Como j’foi dito, lembra também a tradição do maná do deserto. Isso significa que o projeto do Reino que Jesus quer trazer é de partilha e gratuidade. Do maná do deserto, nada podia sobrar. Do pão repartido por Jesus, todos comem e sobram doze cestos. É um sinal messiânico.

Na tradição judaica, o banquete é símbolo da comunidade dos últimos dias (Cf. Is 48, 21; 49, 9 - 10; 55, 1; Sl 23, 1- 5 e outros). Os documentos do Mar Morto dizem que cada refeição é sinal e antecipação do banquete do Reino de Deus.

Nesse sentido, Mateus dá à narrativa um tom que lembra a eucaristia. Não para reduzir o fato a um acontecimento ritual. Mas, ao contrário para ligar a liturgia à vida. Cada eucaristia deveria ter este sentido de partilha e de anúncio de uma sociedade justa e compassiva.


[1] - Cf. FREI BETTO, Entre todos os Homens.    

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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