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Meditação bíblica, domingo 06 de maio 2012

O evangelho lido hoje nas comunidades (João 15, 1- 8) me fascina e ao mesmo tempo me causa problemas. Quantos padres e pastores o interpretam de forma exclusivista e pouco amorosa com os outros e de diferentes tradições. De fato, Jesus diz: quem não fica ligado a mim é como um ramo que cai da videira, fica seco e morre. Sem mim nada podeis fazer. Eu sou a videira verdadeira... É um texto belo, mas facilmente interpretável em uma chave fundamentalista. E os que não creem em Cristo, não se salvam? São como ramos que caem da árvore e ficam podres? 

Acho impressionante como em pleno século XXI com mais de um século de exegese histórico-crítica (vem do século XIX), ainda há padres e pastores que interpretam uma palavra dessa como se na hora da ceia alguém tivesse anotado ou gravado em algum gravador do século I palavra por palavra o que Jesus falou. Como a gente sabe que não foi assim e que o evangelho de João não foi escrito antes dos anos 90 ou mesmo 110, esse texto posto na boca do Senhor, reflete mais a meditação da comunidade joanina do que as palavras históricas do próprio Jesus. E eu as aceito e as amo. Considero-as mesmo como palavras que para mim são como de Jesus, mas compreendidas no contexto de uma relação entre ele e a comunidade íntima dos discípulos. Não é uma afirmação dogmática de uma verdade sobre as religiões. É como um marido que diz para a mulher: "Para mim, só existe você no mundo". Ela compreende no seu contexto real. Não vai pensar que para ele todas as outras pessoas do mundo não valem nada ou ele não as considera. O que ele está dizendo "só você" é na intimidade do casamento e do amor deles. De fato, eu leio esse trecho do evangelho em outra chave: toda a Bíblia diz que Israel era a vinha de Deus (salmo 80, Isaías 5, Jeremias 2 e tantos outros textos). Mas, essa vinha não estava mais produzindo frutos. (Em Isaías Deus diz: Nela procurei uvas e só encontrei espinhos). Isso é o contraste que Jesus usa ao dizer: A videira verdadeira sou eu. Não é mais a instituição religiosa que deveria produzir frutos, mas embora possa ser bonita e frondosa como uma videira enorme, não produz frutos de justiça e amor. Isso vale com a religião judaica do seu tempo (não estamos falando de todo Judaísmo que não merece essa crítica), mas também vale como uma interpelação profética a toda forma de religião, inclusive às nossas Igrejas. Em 2009, o filósofo italiano Gianni Vattimo publicou um artigo cujo título era: "Será que toda religião é inimiga da civilização?" E ali ele criticava a Igreja que usa lobby para defender seus interesses como sendo de Deus e se mete na política dos países para impedir que se votem em leis que vão contra a moral eclesiástica e para forçar os governos a seguir as leis da Igreja como se essa ainda fosse dona da sociedade. E a um ponto do artigo, ele diz: "Graças a Jesus, eu me tornei ateu!" E ele diz que o papa atual declarou: "A verdade (ou melhor a interpretação que ele faz da verdade) é inegociável" (artigo publicado no jornal El Pais de Madrid, 01/ 03/ 2009). Deixo-me interpelar pelas palavras desse filósofo e quero consagrar minha vida para que a minha Igreja que amo muito seja mais de acordo com o evangelho, aceite sempre dialogar com a humanidade e assuma sua missão de simples servidora do povo e não proprietária ou controladora das verdades. E aí sim só Jesus é a videira verdadeira. E só a ele estamos ligados como ramos na videira. 

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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