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Meditação bíblica, domingo, 09 de fevereiro 2014

Neste domingo, o evangelho lido nas comunidades foi Mt 5, 13- 19. Retomo aqui o que escrevi em meu livro "Conversa com Mateus": 

No sermão da montanha, Jesus alterna palavras dirigidas a todo o povo com outras que se endereçam mais especificamente aos discípulos e discípulas: “Vocês são o sal da terra e a luz do mundo”(5, 13ss ). Há ainda conselhos dados a cada pessoa que o segue (“Quando orares, ou jejuares, ou deres esmola…” – Mt 6). Será que poderíamos distinguir o apelo ao reino dos céus dirigido a todas as pessoas (por exemplo, as bem-aventuranças), o ensino dado aos/às discípulos/às (à Igreja cristã)? Parece que alguns conselhos aplicam isso a situações concretas que cada pessoa deve discernir. Por exemplo, o apelo “reconcilia-te com teu irmão” é dirigido à pessoa. Aí se concretiza: “Assim sendo, se (acontecer que...) estiveres diante do altar para apresentar tua oferenda e te lembrares que teu irmão ou irmã tem algo contra ti, deixa tua oferenda diante do altar e vai primeiro te reconciliar com teu irmão” (5, 24). Então, há um critério fundamental e há tentativas de exemplos ou aplicações que são situações nas quais se deve obedecer ao espírito proposto. O importante é o espírito ou o propósito. A forma de agir pode ser de um jeito ou de outro. Não precisa ser compreendida ao pé da letra. (Por exemplo: “se uma parte do teu corpo te escandaliza, arranca-o!”).

Não sabemos o contexto exato no qual Jesus disse: “Vocês são o sal da terra...” A comunidade de Mateus colocou esta palavra de Jesus no contexto do sermão da montanha (5, 13). Geralmente, por falta de compreensão do contexto histórico, muitas pessoas, tanto católicas como evangélicas, fazem uma leitura fundamentalista desse texto. Entendem o “sal” como sal da cozinha, enquanto vocês falam de “sal da terra”. Sabemos que nas culturas antigas, por conservar a comida e temperá-las, o sal tornou-se símbolo de amizade e aliança imperecíveis.  A Bíblia lembra um rito de aliança com sal: Berith Melah (Cf. Lv 2, 13; Nm 18, 19).

Alguns pensam que na Palestina de Jesus, os pastores levavam as ovelhas para o campo e, durante o dia, as deixavam soltas pastando. À noite, elas tinham de voltar ao aprisco para não serem presas das feras. Voltavam comendo o sal da terra que era freqüente na beira do lago de Tiberíades e do Mar Morto. Como na história infantil de João e Maria, com o caminho das pedras, o sal da terra conduzia as ovelhas de volta ao rebanho. Assim, quando Jesus disse: “Vocês são o sal da terra”, estava dizendo: “Vocês têm a função de reunir as pessoas dispersas no aprisco do Pai para que não se percam nem sejam presas das feras do mundo”. A missão dos discípulos é o de unir a humanidade no reino do Pai.

Outros comentadores se perguntam se não haveria no texto uma confusão entre o termo aramaico “ ’eres”(terra) e o termo “ ’arsa” (fogueira). Era costume na Palestina usar o sal para ativar as fogueiras (à noite, no campo) e quando o sal perdia o seu material combustível, não conseguia mais ativar o fogo. (Comparar com texto dos outros evangelistas: “Todos devem ser salgados no fogo”(Mc 9, 49). “O sal que perde a sua força não é mais útil nem para a terra nem para a cozinha”(Lc 14, 34). Será que a recomendação de Jesus: “Tende sal em vós mesmos” (Mc 9, 50) não significaria, de fato: “Mantenham em vocês o calor, a capacidade de aquecer a vida”. Sei que depois, a imagem teria sido usada no mundo grego com outro simbolismo. O sal é o que dá sabor. O sabor da vida é adquirido pela sabedoria. “Ter sal” significaria: “Ter sabedoria”. O sal se tornou símbolo da sabedoria[1].

A insistência de Jesus é para que os seus discípulos e discípulas assumam a função que é de todo o povo de Israel de ser sal e luz. Cada pessoa humana tem uma “reserva de luz”. Este potencial luminoso está como que inscrito em nossas células e precisa ser desenvolvido. O sal seria o elemento que reúne, congrega e unifica no íntimo da pessoa a sua parte luminosa e a parte de trevas que cada um tem em si. A partir de agora, sal e luz não serão mais apenas os rabinos e doutores. Jeus proclama todos os discípulos sal e luz do mundo. E adverte: “Não enlouqueçam!” (o termo original “morainein” não quer dizer “tornar-se insosso” e sim “enlouquecer”). O símbolo da luz também era usado para a comunidade de Israel. Já os cânticos do Servo Sofredor diziam que o servo deveria ser luz para o mundo todo (Is 49, 6). Agora, Jesus aplica à comunidade dos seus discípulos. Toda a comunidade deve ser missionária nesse sentido de iluminar a humanidade com a luz do reinado divino.


[1] - Cf. SCHNNACKENBURG, citado por Ortensio da Spinetolli, idem, p. 150.

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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