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Meditação bíblica para o domingo 13 de março 2016

Nesse 5º domingo da Quaresma do ano C, as leituras são muito provocativas para todos nós. A primeira leitura lembra que o projeto de Deus é libertar-nos de todas as nossas escravidões. E a base que nos faz sempre crer que é possível esse caminho é o Êxodo. A leitura de Isaías 42, 16- 21 nos confirma que Deus está sempre disposto a renovar conosco esse caminho de libertação.

Ainda temos tanto a fazer nesse plano da libertação pessoal - no plano do sair da gente mesmo para o outro, no plano da libertação de certas coisas que nos prendem - seja no plano econômico, seja no plano afetivo e tantos outros (a questão do poder, por exemplo). Na segunda leitura, (Fil 3, 8- 14), temos Paulo que confessa: "eu mesmo não cheguei ainda a alcançar essa meta. Estou no caminho".... No evangelho, temos o encontro de Jesus com a mulher surpreendida, como diz o evangelho, em flagrante de adultério. (João 8, 1 - 11). Quase todos os estudiosos da Bíblia concordam que esse não é um texto original do evangelho de João e deve ter sido acrescentado ao conjunto quando todo o evangelho já estava escrito. De todo modo, corresponde a uma atitude fundamental de Jesus e sem dúvida tem uma base histórica.

A primeira coisa que me surpreende é como os religiosos da época querem a todo custo condenar Jesus  e não fazem isso com instrumentos do mal, mas se servem das coisas mais santas, da própria lei de Moisés que o Judaísmo e o Cristianismo crêem ter sido revelada por Deus. Até hoje, temos de ter cuidado com isso. A lei que foi feita para garantir os direitos humanos, a justiça, a dignidade de todos, é usada para oprimir as pessoas, para controlar o povo e pode ser instrumento para fazer o profeta cair na armadilha dos seus inimigos. A lei de Deus se insere nas culturas humanas e por isso assume costumes humanos que na época e hoje nem sempre são os mais abertos. A sentença de apedrejar uma mulher adúltera era para salvar a instituição do casamento. Mas, que casamento monogâmico, se o homem podia ter várias mulheres e a mulher era dada ao parente do marido morto como se fosse uma propriedade que ele herdou? Parece que no tempo de Jesus, o flagrante de adultério poderia inclusive nem ser uma relação sexual. Uma suspeita de assédio ou um flerte eram vistos como adultério. E por isso, a mulher poderia ser adúltera, sem haver um homem adúltero. O evangelho não discute a culpa da mulher. Ela é culpada. Não é como a Susana do Antigo Testamento (Dn 13) que iria ser apedrejada porque os dois juízes sem vergonha a queriam como mulher e ela era direita. Não aceitou. Deus a salvou através da sabedoria do jovem Daniel. Nesse caso do evangelho, não. A mulher era culpada. Mas, ali ela é apenas instrumento ou arma para que os doutores da lei (professores da Bíblia, em geral religiosos do templo) pudessem pegar Jesus e o acusar perante o sinédrio dele ser contra a lei de Moisés. E para isso se serviam da coisa mais santa, a lei. Jesus não entra no jogo deles: Diz: quem de vocês não tiver pecado, atire a primeira pedra. Aqueles homens sábios e religiosos foram até honestos. Poderiam ter escondido, negado que eles eram coniventes com o que acontecia na cidade no campo das relações morais. Tiveram a honestidade de sair todos, um por um, como diz o evangelho:  a começar pelo mais velho. Jesus se encontra sozinho, ele e a mulher. E ela confirma que ninguém a condenou. Jesus simplesmente lhe diz: Vai em paz e não peques mais. 

          Comumente, os profetas são pessoas que devem tomar muito cuidado com as mulheres. Na época de Jesus, as mulheres eram vistas como fonte de impureza e ocasião de pecado e sedução. O próprio João Batista, o profeta que foi mestre de Jesus, foi morto por mando de uma mulher Herodíades e pelo pedido de sua filha Salomé. Os grupos judaicos quando construíam as sinagogas faziam uma grade e as mulheres assistiam o culto no sábado por trás das grades. Jesus é diferente. Vivia rodeado de mulheres. Maria Madalena. As irmãs Marta e Maria de Betânia, várias discípulas que o acompanhou a Jerusalém desde a Galileia, sem falar nas  mulheres doentes e até prostitutas de aldeia que se aproximavam dele. Nenhum outro profeta daquele tempo era assim. Jesus olha as mulheres com olhos diferentes. Trata-as com ternura. Defende sua dignidade. Até as acolhe como discípulas.

Quem nos ensinará hoje a olhar a mulher como Jesus olhou? Jesus é profeta da compaixão e da misericórdia do Pai.

Temos que sonhar com uma Igreja mais justa e mais igualitária em relação à mulher. Romper o silêncio diante da violência doméstica. 

Atualmente, tenho a impressão de que alguma coisa dessas histórias se repetem. Não tenho nenhuma simpatia pessoal pela presidente Dilma e sofri com o fato de vê-la fazer uma campanha para se eleger com promessas de esquerda e no dia seguinte fazer todos os acordos com a direita. Sou contra todas as propostas tipo ajuste fiscal e reforma da previdência. Sou contra a tentativa dela ser aceita pela direita que só a faz ser rejeitada por uns e pelos outros. Sei que amanhã, a direita está mobilizando milhares de pessoas no Brasil todo contra a Dilma. No fundo, estão repetindo essa história de instrumentalizar a mulher. O objetivo deles não é Dilma que eles já impedem de governar. O objetivo é acabar com Lula e o PT. Lula e o PT não foram capazes de ter se mantido fiéis aos sonhos e propostas de uma nova sociedade. Entraram profundamente e muitas vezes não de forma correta no sistema que antes combatiam. No entanto, Lula e todos os cidadãos têm direito à presunção de inocência até que se prove sua culpa. Não podem ser condenados antes de ser julgados apenas por ser do PT e porque a direita muito pior e muito mais corrupta quer retomar o poder que sentiu ter em parte perdido. 

Será que nesse domingo, as Igrejas cristãs serão capazes de atualizar a palavra da misericórdia de Jesus ou serão coniventes com a onda de ódio e violência irracional que os meios de comunicação atiçam e ficam felizes de ver pegar fogo? 

A CNBB fez nesses dias uma nota sobre a realidade nacional. Achei-a inócua e inútil. Linguagem eclesiástica e diplomática totalmente distante da linguagem direta e profética de Jesus. Sei que não é fácil quando se tem de representar uma sociedade heterogênea e falar em nome de muitos. Mas, penso que quando não se pode ser claro, é melhor ficar calado.

O CONIC (Conselho Nacional de Igrejas Cristãs) foi mais feliz. Fez uma declaração simples e direta contra a tentativa de golpe e pedindo igualdade nos julgamentos, seja contra os do PT, seja contra os de outros partidos que o Moro e os juízes que hoje impõem sobre o Brasil uma ditadura real não se preocupam em ser coniventes e não têm pressa em julgar.

Que nessa Páscoa, ao menos, a partir das bases, as pessoas percebam com um pouco mais de inteligência em que direção aponta Deus para uma libertação integral de nosso país.

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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