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​Meditação bíblica para o domingo 27 de outubro 2013

- O fariseu e o publicano (Lc 18, 9- 14)

O texto do evangelho de hoje apresenta duas atitudes espirituais extremas. Faz isso como método para discutir qual deve ser a atitude correta da pessoa orante diante de Deus.

 Isso foi mostrado dessa mesma forma na parábola do pai misericordioso e os seus dois filhos (15, 12 ss), um justo (o mais velho) e o outro pecador (o mais novo) e também na do rico e de Lázaro (16, 19- 31). Agora, os dois protagonistas são um homem religioso e observante do grupo dos fariseus e um outro que era publicano, colaborador dos romanos e vivia transgredindo os preceitos da lei, além de ser considerado meio desonesto. 

Na época das comunidades dos evangelhos, os fariseus eram os chefes das sinagogas e eram considerados o que seu nome indica: separado dos outros e santo. O fariseu dessa parábola ora de acordo com a tradição judaica: a oração de bênçãos e de agradecimento a Deus, a beraka. A oração dele pode ser encontrada em salmos como o Sl 17, 3- 4; 18, 21- 25 e 26, 3- 12. No tratado das bênçãos do Talmud tem orações bem semelhantes a essa do fariseu. São belas e profundas. A pessoa ora de pé e de cabeça levantada. É o sinal da aliança. Tem com Deus uma intimidade que o faz relacionar-se assim com a divindade. Será que mesmo algumas orações de Jesus, descritas nos evangelhos, como a de ação de graças depois da volta dos discípulos em missão, não foram nesse modelo? (Lc 10, 21- 14). De acordo com o evangelho de João, a chamada oração “sacerdotal” de Jesus (Jo 17) também parece deste estilo. Isso significa que não é o estilo ou o conteúdo da oração do fariseu que acarreta problema. É o seu espírito. A atitude interior que está por trás. O fariseu não está mentindo. Ele é mesmo diferente dos outros homens e tem toda razão de dizer que é fiel e justo. É como o filho mais velho da parábola dos dois filhos em Lc 15.

O publicano é um cobrador de impostos, odiado pelos judeus por sua colaboração com o sistema romano e pecador por se relacionar com pagãos e por extorquir dinheiro dos pobres. Ele não ousa entrar no templo. Ora de cabeça baixa, batendo no peito e dizendo somente: “Tem piedade de mim que sou pecador” (invocação que inicia o salmo 51).  Como o reino de Deus vem de graça e de preferência para os que precisam de perdão, o fariseu justificava-se a si mesmo e por isso não foi justificado por Deus (não precisava de ser justificado por Deus porque ele mesmo já era justo), enquanto o publicano saiu de sua oração perdoado e justificado porque se colocou como pecador. 

 Hoje, a gente tem problema com um tipo de espiritualidade que insiste muito no pecado. A psicologia nos ajuda a ver a importância da auto-estima e a consciência de nossa dignidade. Nada de ficar dizendo: eu não presto. Eu sou um verme. Penso que hoje devemos procurar uma espiritualidade que não procure nem se exaltar no sentido de auto-pretensão ilusória e nem também a humilhação que não corresponde à verdade. Quem acompanha pessoas psicologicamente sabe como é importante ajudar as pessoas a se estimarem e se valorizarem adequadamente e não se sentirem pecadoras e más. 

 Quem entender desse modo o evangelho, entende errado. Não é essa a finalidade ou o espírito desse texto. O seu objetivo é justamente, ao contrário, realçar a igualdade de todos diante de Deus e sua graça em perdoar e querer bem a todos. A linguagem da justificação é como uma parábola. 

Quanto à questão da exaltação e da humildade, talvez a religião seja, na história da humanidade a virtude que mais tem gerado uma espécie de consciência de superioridade em relação aos outros. Por isso, a espiritualidade evangélica propõe como caminho a humildade. Não a humilhação. A humildade vem do termo húmus e significa a pessoa ter os pés na terra, assumir sua verdade, não querer ser o que não é. Assumir sua realidade de criatura frágil e carente. Exatamente para crescer e viver a alegria de amar e ser amado. Vejam que o episódio a seguir fala de crianças e pequeninos. 

Diante desse evangelho, eu me coloco diante de Deus e procuro me rever, se como monge ou padre, às vezes, inconscientemente e sem perceber, eu não assumo essa postura do religioso bonzinho e justo que se olha a si mesmo e se apresenta como pessoa de Deus - no fundo, melhor do que meus irmãos. Quando tenho essa tentação - e às vezes, ela me vem - lembro da palavra de Jesus aos discípulos mais chegados, São Pedro, São João e os outros: Em verdade, vos digo, as prostitutas e os publicanos - pecadores públicos chegarão antes de vós no reino de Deus - Mt 21, 31). Aí Deus me faz ver minha fragilidade e que o pouco que sou só consigo ser por sua graça. O começo do começo do caminho espiritual em que me encontro devo apenas e somente a ele e percebo que tudo é graça. 

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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