Desde ontem, estou em Santa Maria, RS. Aqui assessoro o 14o curso Oscar Romero, curso intensivo de teologia pastoral para jovens e agentes de pastoral de base. Desta vez, me pediram para assessorar a reflexão sobre as comunidades eclesiais no 50o aniversário do Concílio Vaticano II. São quase cem participantes, a maioria de leigos e de jovens.
Hoje, nas Igrejas antigas, é a vigília da festa da Epifania, ou seja, manifestação do Senhor ao mundo. As Igrejas orientais chamam de festa da Teofania e nela celebram o batismo de Jesus. A Igreja latina tem como centro dessa festa o evangelho da visita dos magos a Jesus menino. Por isso, o povo passou a chamá-la de festa dos reis magos. Reparto com vocês a reflexão que fiz sobre essa celebração nessa semana:
Reis magos, somos todos nós!
Nestes dias, no Brasil, o povo faz danças populares como pastoril, reisado e outras que dramatizam a viagem dos magos até Belém para ver o menino Jesus. Em outras regiões, procissões de devotos e folias de reis levam, de casa em casa, a bandeira do Menino e invocam a benção divina para as famílias. Há quem julgue essas tradições como resquícios de um tempo passado e de culturas rurais que as cidades destruíram. Entretanto, o significado profundo dessa piedade se mantém vivo e atual. De fato, mesmo se as comunidades cristãs sabem que o evangelho conta a visita dos sábios do Oriente ao menino de Belém de modo simbólico, isso não diminui a fé. A tradição os tornou reis magos e fez da viagem deles, conduzidos por uma estrela, do Oriente até Belém o protótipo de toda a busca humana do Mistério.
Pessoas pertencentes a todas as tradições espirituais, intelectuais de todas as culturas, mesmo se não pertencem a nenhuma religião específica vivem uma peregrinação interior na busca de apreender e viver o mistério mais profundo da vida. A luta cotidiana pela existência e a agitação da sociedade atual tentam as pessoas a esquecer ou mitigar essa busca. O sentido mais profundo das celebrações populares do Natal e Reis Magos é revigorar essa procura no mais profundo de cada um/uma.
Desculpem voltar aqui a falar desse assunto, mas me parece importante. Este começo de 2013 coincide com a exibição no circuito cinematográfico mundial do filme “A história de Pi”, filme do diretor tailandês Ang Lee. A partir de um romance canadense, ele nos mostra o jovem hindu com esse nome engraçado e enigmático (Pi). Ele se diz, ao mesmo tempo, hindu, cristão e muçulmano e deve sobreviver a um naufrágio e enfrentar o mar revolto em um pequeno barco e junto com um tigre de Bengala, do qual deve se defender e, ao mesmo tempo, conviver. O oceano de Pi simboliza o universo no qual navegamos, cada um em seu pequeno barco, junto com seus anjos e suas feras. As devoções populares natalinas, assim como o filme nos fazem reviver a busca que os evangelhos simbolizam ao contar a visita daqueles astrólogos do Oriente a Jesus. Hoje, os reis magos somos nós e todas as pessoas que não desistem da busca interior e se dispõem a aprofundar o diálogo na escuta e no aprendizado uns com os outros. Que, para cada um/uma de nós, esse ano novo seja marcado pela verdade do que canta Milton Nascimento em uma de suas mais famosas canções: “Por tanto amor, por tanta emoção, a vida me fez assim. Doce ou atroz, Manso ou feroz, eu, caçador de mim”.