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Meditação bíblica, sábado, 08 de junho 2013

Esse domingo é marcado pela leitura do evangelho da revivificação do filho da viúva de Naim (Lucas 7).                  

O evangelho de Lucas é o único que conta essa história. Há quem a interprete em um sentido simbólico. O texto conta a recuperação da vida daquele rapaz de um modo que anuncia a ressurreição de Jesus. Alguns pais da Igreja viram neste relato uma reprodução de uma narrativa pascal. A morte não será mais irreversível. A força da ressurreição, presente em Jesus, terá a última palavra.

Cada texto é passível de muitas interpretações. É bom lembrar o contexto em que essa cena foi colocada no evangelho. Logo a seguir, Jesus responde às dúvidas e questionamentos de João Batista. E ele diz aos enviados por João: “vão e contem o que vocês viram e ouviram: os cegos vêem, os surdos ouvem, os leprosos são curados e os mortos ressuscitam...” Mas, para ele dizer isso e poder dizer que os discípulos de João viram, era necessário contar, ao menos, uma cena de ressurreição. Por isso, essa cena vem neste lugar. Vários pais da Igreja viram nessa viúva a figura do povo pobre, lidando com a morte e a impotência. Vários profetas usaram essa imagem de viúva para a comunidade de Israel, enterrando seus filhos massacrados pelos impérios de então (Is 51, 18- 19 e 54, 4. 8). A cena é narrada de modo sóbrio. Naim é uma aldeia que fica na estrada entre Cafarnaum e a Samaria. Jesus vem reunir todo tipo de pessoas: homens e mulheres, crianças e adultos, judeus e pessoas de outras raças e culturas. Agora, o seu grupo se encontra com outro grupo: o das pessoas que levavam para enterrar o filho único de uma mãe viúva. Na sociedade de Jesus, a mulher era marginalizada. Uma mulher já viúva que ainda perde seu filho único está totalmente desamparada. Ela é pobre, aflita e injustiçada, três categorias das quais Jesus falou nas bem-aventuranças. A tradição judaica pedia uma atenção especial com as viúvas (Cf. Eclo 4, 10). O salmo 68 canta: “Deus é pai dos órfãos e protetor das viúvas” (Sl 68. 6). Dos Evangelhos, Lucas é o que mais fala em viúvas. Ao todo, nove vezes aparecem viúvas no seu texto. Os antigos profetas tiveram suas atividades junto a viúvas. Elias e Eliseu recuperaram a vida de crianças falecidas, filhos únicos de mãe viúva (Cf. 1 Rs 17, 17- 24 e 2 Rs 4, 32- 37).  A tradição judaica esperava a volta do profeta Elias para trazer ao mundo os últimos tempos. O evangelho de Lucas mostra Jesus refazendo alguns gestos dos profetas, mas superando-os (basta comparar este texto com 1 Rs 17, 17- 24). O povo chama Jesus de profeta, como Elias e Eliseu, pais do profetismo.  Pela primeira vez, Lucas chama Jesus de “Kyrios” (Senhor), título com o qual a tradição judaica, para não dizer o nome divino próprio, se referia a Deus: “Adon, ou Adonai”. Hoje, este título tem uma conotação patriarcal que nós, ligados à teologia feminista, não gostamos. Entretanto, no tempo das comunidades como a de Lucas, este título tinha uma conotação subversiva de ser contra o imperador de Roma. Para significar uma subversão correspondente, hoje, deveríamos traduzi-lo por um termo que não seja exclusivo para homens machos. 

O irmão Antônio, mestre da catequese e acompanhador de movimentos populares e de muitos trabalhos com sofredores de rua, completa:

“O texto se conclui por essa palavra que resume uma constatação importante: ´Um grande profeta surge entre nós e Deus visita o seu povo”. O verbo grego usado para visitar: episkeptomai era usado no tempo antigo para as visitas de cuidado e verificação que o pastor fazia ao rebanho no campo para ver se as ovelhas precisavam de alguma coisa, se havia alguma ovelha doente e se o rebanho corria algum risco. Por isso, este verbo passou a ser usado para expressar as visitas libertadoras de Deus. Em Ezequiel 34, Deus diz: “Eu mesmo virei visitar o rebanho para cuidar de minhas ovelhas. Irei reconduzi-las de onde estiverem dispersas, buscarei aquela que se perdeu e reconduzirei a que se tiver afastado. Vou aplicar curativos na ovelha que se tiver ferido e irei curar a que estiver doente...” (Ez 34, 11- 16).

             Então, o povo antigo reservou este verbo visitar para as ações libertadoras de Deus como o Êxodo. O próprio evangelho de Lucas começa cantando: “Bendito seja o Senhor, Deus de Israel, porque visita e liberta o seu povo” (Lc 1, 68). A teologia da libertação tem razão: Deus visita para libertar o povo oprimido

( esse texto faz parte do meu novo livro: Boa Notícia para todo mundo. Conversa com o Evangelho de Lucas).

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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