"Todos os livros da Bíblia são santos, mas o Cântico dos Cânticos é o mais santo", dizia o rabino Aquibá (sec I). Ele dizia que era o mais santo porque é um cântico de amor. De fato, o que pode haver de mais revolucionário e transformador no mundo do que uma declaração de amor? No caso do Cântico dos Cânticos, se trata de um amor erótico e de paixão arrebatadora entre um homem e uma mulher. É possível que no início tenha sido um cântico de amor entre uma camponesa de Sunan, planície ao sul da Galiléia e um pastor de ovelhas a quem ela chama de meu amado (Doddi) e que tem quase o mesmo nome de Davi. Uma possível leitura do texto é que um terceiro personagem seria o rei (Salomão) que quer a mocinha no seu harém e ela foge para se reencontrar com o seu pastorzinho. O poema se conclui pela expectativa e pelo desejo. De fato, nunca o amor é totalmente saciado. Ele fica sempre incompleto e em estado de profecia. Este livro bíblico me recorda sempre Violeta Parra, a grande cantora chilena. Sempre me comoveu o fato de que ela aos quase 50 se apaixonou por um rapazinho de 17 e compôs a belíssima "Volver a los 17" e sofreu a impossibilidade de viver aquele amor. Mas, já no final dos seus dias, fez a obra prima que foi "Gracias a la Vida". Acho maravilhosa intuição de dizer que quem ama é chamado a ver os olhos, a voz e os passos da pessoa amada em todo ser humano que encontra. Assim o amor se espalha em todas as direções.