Hoje, um jovem me perguntou: Por que devo ser cristão? O que ganho com isso? Respondi: Você não deve ser. Pode ser, se quiser. E não ganha nada com isso no sentido de ganho ou lucro direto. Não acredito em amizade que seja com interesse. A fé é uma opção e é gratuita. Mas, pergunta ainda ele, o que caracteriza ou diferencia a fé cristã de outras crenças? No começo, achei que não sabia lhe responder. Nunca me preocupei com o que nos diferencia. Preocupo-me bem mais em compreender o que nos une aos outros. Mas, ele insistia em saber o que é próprio da fé cristã. Não sei. Talvez o amor incondicional que ama sem pedir reciprocidade e sem cobrar nada e se expressa na cruz, ou seja na doação da vida. Ao menos, isso foi o que Jesus fez e como ele nos revelou Deus, como amor capaz de dar a vida por nós. Na América Latina de tanta pobreza e tanta desigualdade social, normalmente, para mim, o que distingue um verdadeiro cristão seria o compromisso de transformar esse mundo a partir da solidariedade aos excluídos. Não consigo imaginar um verdadeiro cristão insensível ao sofrimento e à dor de seus irmãos e essa sensibilidade tem se expressar não só no plano do sentimento pessoal, mas de uma postura de vida - solidária e tenhamos coragem de dizer: revolucionária. Hoje, as Igrejas antigas celebram a memória dos santos inocentes: as crianças de Belém que segundo a tradição ou o conto evangélico (é um conto) foram mortos a mandado de Herodes. Mesmo sendo como uma parábola, é duro pensar que o nascimento de Jesus provocou imediatamente a fúria do tirano e, como consequência, a morte de tantas crianças e a dor de tantos pais e mães pobres. No seu evangelho de Jesus Cristo, Saramago que toma esse texto como se fosse relato histórico, critica José porque este, assim que, por um aviso do anjo, soube do que iria acontecer, fugiu com o menino e sua mãe e não preveniu os outros pais sobre as intenções de Herodes. Se o fato fosse histórico, de fato, ele teria toda razão na sua crítica a José. No relato dos evangelhos, a única intenção era mostrar que, desde criança, Jesus reconstitui o êxodo de Israel, tanto que Mateus encerra todo esse episódio contando que José voltou do Egito com Maria e o menino para cumprir o profeta que disse: "Do Egito chamei meu filho". Hoje ainda no meio das lutas atuais, temos sim que refazer o êxodo de libertação.