O chamado do Amor
Em muitos países, o 14 de fevereiro é um dia importante para
as pessoas apaixonadas e para os amigos. O motivo é que, nesse dia, no antigo calendário
católico, se fazia memória de São Valentim. Conforme a lenda, no século III, para
que os jovens pudessem permanecer disponíveis para ir à guerra, o imperador
proibiu que, por um tempo, a Igreja abençoasse casamentos. No entanto, o bispo
Valentim os celebrava escondidos. Um dia, isso foi descoberto. O bispo foi
preso e condenado à morte. Mesmo na prisão, continuou a abençoar o amor dos
jovens. Por isso, em muitos países, até hoje, o "Valentine days" é o
dia dos namorados. Outra lenda antiga fala de um cristão chamado Valentim que
se entregou aos guardas do imperador para ser preso e morto no lugar de um
amigo, denunciado como cristão. Baseado nisso, a ONU considera o 14 de
fevereiro como "o dia da amizade".
Hoje em dia, todo mundo fala de amor. No entanto, em muitas
canções, telenovelas e filmes, se ressaltam mais impulsos egoístas de posse do
outro do que uma peregrinação de amor que conduz uma pessoa ao coração da
outra. E quando, nessas obras comerciais, o amor chega a ser mostrado, é de um
modo idealizado, irreal e longínquo de nós, pobres mortais, envolvidos em uma
realidade de vida bem mais complexa.
Nos anos 70, uma palavra de ordem da juventude dizia:
"Faça o amor, não faça a guerra". Em tempos de lutas sociais e
políticas acirradas, a esquerda privilegiava relações coletivas, lutas de
classe e a solidariedade política na luta pela justiça e libertação dos
oprimidos. A dimensão subjetiva e as relações afetivas de cada um eram mais
valorizadas por grupos alienados ou ligados ao sistema dominante. Só que para
muitas pessoas, as questões afetivas se tornavam o único eixo de vida que
interessava. E até hoje, a televisão continua oferecendo o amor romântico como
pão e circo para as carências da massa.
O desafio atual das pessoas e grupos comprometidos com a
vida é unir as pontas de uma realidade que, embora complexa, é uma só. O
presidente Hugo Chávez gostava de repetir que, na luta política, tinha
aprendido que as revoluções, se não procedem do amor e não são permanentemente embebidas
de amor, se tornam inúteis e contraproducentes. Assim, nesses dias difíceis que
atravessamos, em um Brasil incendiado por ondas de violência e de ódio,
qualquer brisa de amor refrigera e toda forma de carinho vale a pena.
Não existem muitos amores. O amor é um só, embora tome
formas e expressões diferentes. O amor de mãe, amor de irmãos, de namorados ou
de amigos, têm todos o mesmo DNA. Vêm todos da mesma fonte. Há uma inteligência
amorosa, presente no universo e atuante nas pessoas e em todo ser vivo. As
religiões e tradições espirituais a chamam de Deus. A tradição judaica ensina
que ao criar o mundo, a luz divina se espalhou como chamas de amor por todo o
universo. Então, ao receberem essas faíscas do Amor maior, fonte de todo amor, todos
os seres vivos foram divinizados. Entre eles, cada ser humano é chamado a
cultivar e desenvolver em si mesmo e nos outros essa chama para que ela não se
apague. As relações familiares, a participação comunitária e os relacionamentos
de amizade e de amor conjugal são instrumentos para a realização plena dessa
vocação para o amor.
O amor conjugal tem uma dimensão mais exclusiva. O amor de
amizade é aberto, mais gratuito e incondicional. Por isso, místicos de
diferentes religiões o consideram o sinal por excelência do amor divino no
mundo. Amar é nossa vocação. Todos os seres humanos são chamados a viver esse
caminho. Somos felizes quando nos sentimos nele e por ele nos deixamos
conduzir.
Todas as formas de amor são assumidas pelo Espírito Divino
que se manifesta em todo e qualquer amor humano. No entanto, o Espírito de Amor
nos chama a sermos cada vez capazes de um amor gratuito e mais generoso.
Trata-se de amar até quem não ama, de levar amor onde não há amor, de modo
incondicional e sem limites. Esse amor de doação total pode conter em si a
dimensão erótica. Pode também assumir a expressão de uma amizade bela e madura.
Mas é, principalmente, amor de
solidariedade e bem querer gratuito. No grego bíblico, se chama agapé e está contido na expressão
"Deus é amor. Quem vive o amor permanece em Deus e Deus está nessa
pessoa" (1Jo 4, 16).