Ao meditar no evangelho que as Igrejas proclamam nesse domingo (Mt 16, 21-27), fico impressionado que todos os comentários vão no sentido de mostrar como Jesus declara que será assassinado pelo poder - poder político e religioso. São os mais altos dignatários da religião que matarão Jesus com a aceitação e a conivência do poder político. Assim mesmo, todas as Igrejas continuam convivendo com o poder como se nada tivesse ocorrido, nem Jesus tivesse dito nada sobre isso. Convivem muito bem com o poder político e eles mesmos acham normal exercer o poder religioso.
Conforme o evangelho, Jesus recebe um forte xingamento de Pedro. No texto original, ele diz a Jesus que Deus te perdoe pelo seu pecado. Qual? O de rejeitar o poder messiânico. E Jesus usa com Pedro as mesmas palavras que usou com o diabo no deserto: Para fora, para trás de mim, Satanás...
É um texto do evangelho problemático. De um lado, Jesus diz que quem quer ser discípulo dele tem de renunciar a si mesmo, tomar a sua cruz e segui-lo. E a Igreja sempre usou isso para pregar uma religião voltada para a penitência, para o sofrimento e para a mortificação. Despolitizou e desocializou a cruz tornando-a como se fosse uma espécie de vontade de Deus. De fato, a cruz é consequência da missão em um mundo contrário ao projeto divino. A cruz é o sofrimento vindo da missão de assumir com Jesus o serviço e a solidariedade.
Não vejo como seguir esse evangelho, hoje, sem rever meus pensamentos de ambição de sucesso e de busca de honras. Até hoje, percebo a dificuldade em aprender a perder, isso é, em aceitar o caminho da desonra. No tempo de Jesus, quem tomava a cruz na estrada era insultado, cuspido, machucado e humilhado de todas as maneiras. Os discípulos não deveriam ter sorte melhor do que o seu mestre.
Há anos atrás em um congresso de teologia, convidamos para falar um teólogo muçulmano. Ele não diz fazer discurso. Só nos perguntou: O que vocês fizeram com o Cristianismo para que o Império o aceite de forma tão tranquila? Qual foi o segredo????