O projeto de Igreja em saída e a mulher
Neste 07 de fevereiro, lembramos mais uma vez o aniversário natalício de Dom Helder Camara. Esta lembrança, em plena pandemia, nos faz pensar sempre em retomar o projeto evangélico da Igreja doméstica, seja no sentido de revitalizar as comunidades de base, como também de aprimorar a proposta revolucionária de Jesus nos trabalhos de base.
O evangelho deste 5º domingo comum, Marcos 1, 29- 39 continua mostrando um dia típico da atividade de Jesus e, como já vimos, nos textos anteriores, a primeira ação de Jesus foi combater o mal onde ele se manifestasse. Primeiramente, Jesus expulsa o mal de dentro da sinagoga. Da sinagoga para a casa. Na sinagoga, o texto mostrava Jesus sozinho. Agora Jesus aparece com seus primeiros quatro discípulos: André e Pedro, Tiago e João.
O evangelho de Marcos estabelece um contraste entre a sinagoga, lugar da instituição e a casa, lugar da família, da intimidade, das relações pessoais. A casa representa a comunidade dos discípulos. No tempo em que foi escrito o evangelho, a casa significa a Igreja doméstica. Não apenas a comunidade representada por cada família e sim a comunidade de base, o grupo de vizinhança. Marcos vê a casa como símbolo de um novo sistema de relações de convivência oposto ao sistema simbolizado pela sinagoga. A tarefa de Jesus é feita, a partir da casa das pessoas. Ele quer restaurar a casa de Deus em nós... No centro da cena, está uma mulher doente. Na cultura da época, qualquer doença era associada à possessão diabólica. Para a compreensão da época, ela estava sob o poder de Satanás.
As pessoas dizem a Jesus que a mulher está com febre. Ele não diz nada. Não faz nenhum gesto. Só “a toma pela mão e a levanta”. Levantar-se é o verbo usado para falar da ressurreição do próprio Jesus. Tomar pela mão é o gesto típico de Deus para salvar o seu povo (Cf. Is 41, 13; 42, 6; Sl 73, 23- 24). E a cena se conclui com a ceia da comunidade a qual a mulher serve.
Assim, o evangelho mostra que aquela mulher se tornou discípula e diaconisa, ou seja, servidora. A mulher é integrada no ministério da comunidade de Jesus. No judaísmo da época, os rabinos ensinavam que os homens e, principalmente, os rabinos não deviam deixar-se servir por uma mulher. Ao contrário, na comunidade de Jesus, uma mulher pode servir como diaconisa. Para isso, ela foi levantada e integrada na comunidade.
Nestes dois versos, temos a primeira síntese ou resumo que aparece no evangelho de Marcos. O primeiro dia de atividade profética de Jesus é um sábado. Jesus se mostra muito livre de agir no sábado, mas as pessoas da cidade não são. Pelo fato daquele dia ser um sábado, eles não podem trazer os seus doentes para Jesus. Tinham que esperar o pôr do sol, porque, ao entardecer, terminava o dia santo. Aí as pessoas carentes de ajuda podiam chegar até Jesus. O evangelho diz que o povo todo da cidade se reunia na porta da casa onde Jesus estava. É uma alusão à Igreja primitiva. De acordo com o texto, ali, Jesus curou muitos doentes. A palavra grega usada aqui significa curar no sentido de restaurar a saúde, mas significa também atender, cuidar das pessoas. Jesus cura os doentes, liberta as pessoas dominadas por energias negativas (no tempo dele se dizia: estão possuídas pelo demônio). Neste momento da pandemia, muitas pessoas têm manifestado este carisma de cuidar dos outros, seja no cuidado da saúde, seja em outras áreas da vida.
No texto do evangelho, vemos já um confronto entre a figura simbólica de Pedro que, para a comunidade de Marcos, representa a Igreja mais institucional e Jesus chama sempre de ir além de “passar para outras aldeias e outros caminhos. Hoje, o papa Francisco nos chama para uma Igreja em saída. É fundamental essa dupla dimensão da Igreja doméstica que vive sua dimensão comunitária interna e, ao mesmo tempo, uma abertura sempre maior para fora... sem limites, sem condições, só com amor.