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Quando a libertação tarda

 

O que fazer quando a libertação tarda

 

                     No evangelho deste 32º domingo comum do ano – Mateus 25, 1 – 13, a comunidade de Mateus coloca na boca de Jesus uma palavra sobre como animar as comunidades quando estas se dão conta de que o reino de Deus não está chegando imediatamente como irrupção de uma mudança no mundo. Parece que as pessoas lutam, lutam e nada parece mudar. As primeiras gerações cristãs pensavam que o reino de Deus viesse logo para mudar a história. Na oração do Pai Nosso, diariamente, as pessoas oram: Venha a nós o teu reino. Jesus tinha prometido: Esta geração não passará sem que venha o Filho do Homem (Mt 24, 34). 

Quando os evangelhos foram escritos já tinham passado duas gerações e nada do reino chegar visivelmente. Jerusalém tinha sido destruída pelos romanos e os judeus obrigados a viver como migrantes estrangeiros nas nações pagãs. E nada da vinda do Filho do Homem Era preciso buscar nas palavras de Jesus uma resposta para isso. 

Provavelmente, a parábola contada neste evangelho reproduz um fato ocorrido naquele tempo. A maioria das parábolas de Jesus eram tiradas da vida comum. O eixo principal da história é uma festa de casamento na qual o noivo atrasa. Nos casamentos atuais da sociedade, quem costuma atrasar é a moça. Naquele caso, foi o noivo. 

Jesus conta essa história para dizer que o reino de Deus é como o tal noivo que atrasou. O povo antigo tinha um ditado que dizia: Deus tarda, mas não falha. A parábola quer nos ensinar como lidar com o atraso da vinda de Deus no mundo.

Nestes tempos de campanha eleitoral, escutamos alguns afirmam que não votam mais em ninguém por que estão desacreditados da Política. Várias vezes, na história, a própria fé cristã provocou desilusões. Parecia que o próprio Deus e  Jesus provocaram decepções.  

Na Alemanha nazista, milhões de judeus foram mortos em campos de concentração. Muitos se perguntaram onde ficaram as promessas de Deus a respeito do povo eleito na Bíblia. Os evangelhos tinham de responder a essa pergunta.  

Este trecho do evangelho faz referência a um costume para nós  estranho. Naquela época, o noivo ia buscar a noiva na casa dela. Ali, o esperava um cortejo de amigas da moça e este cortejo acompanhava o casal até a nova casa onde iam morar. Essas moças iluminavam a festa com tochas acesas, alimentadas com azeite de oliva. 

O evangelho de hoje conta que, naquele caso, cinco moças tinham garantido uma reserva de azeite nas suas vasilhas e outras cinco não. Como o noivo atrasou, algumas ficaram sem azeite. 

As dez moças representam a comunidade que espera o reino de Deus chegar como o noivo vem para a festa do casamento. Esta alegoria quer nos dizer que a comunidade cristã deve viver em função do reino e do Esposo que vem e não da própria Igreja, que no caso, é representada pela esposa. Jesus aproveita o contexto cultural da sociedade patriarcal para dizer que a comunidade tem de ficar atenta aos sinais da vinda do reino de Deus no mundo e não ficar concentrada  na própria Igreja. 

Na história, as moças que tinham reserva de azeite não podiam repartir do seu azeite com as outras. Dizer que elas não podiam dar o azeite uma à outra é afirmar que ninguém pode amar no lugar de ninguém. A responsabilidade de se preparar para a vinda do reino é pessoal e intransferível. 

Quando Jesus contou a história, ele não insistiu na vigilância (até porque todas dormem). O que ele pediu foi que estivessem prontas na hora em que o Esposo vem. O reino não vem logo como se esperava. Mas, é preciso vigiar e se manter preparados/as. 

Atualmente, na realidade que vivemos, de vez em quando temos a impressão de que novamente a libertação prometida está demorando demais. O Esposo atrasou e tarda a chegar. Através desse evangelho, a comunidade de Mateus nos responde: mantenham a lâmpada acesa e sempre com óleo para o momento que for preciso. É como se dissesse: vivam antecipando a utopia que vocês esperam. E isso se concretiza na palavra que Jesus disse no discurso da montanha: “Não são as pessoas que dizem Senhor, Senhor, que entra no reino, mas quem realiza o projeto divino” (Mt 7, 21- 23).

Não adianta essa religião centrada em missas, novenas e devoções. Nesta parábola, o  esposo da parábola fechou a porta do aposento nupcial e disse às moças que ficaram de fora: Não vos conheço! É exatamente a mesma palavra de Jesus no discurso da montanha: “Naquele dia, muitos me dirão: Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? e em teu nome não expulsamos demônios? e em teu nome não fizemos muitas maravilhas? E então lhes direi abertamente: Nunca vos conheci; apartai-vos de mim, vós que praticais a iniquidade” (Mt 7,22-23).

No comentário deste evangelho, Sandro Galazzi escreveu: 

Quem souber repartir, quem souber distribuir a comida aos que moram na casa, este poderá tomar conta da casa e tomará posse dos bens de seu senhor. Vigiar é isso: cuidar da casa e dos seus moradores. Quando o noivo vier, mais ou menos tarde, ele vai faze-lo entrar para participar das bodas. Bem-aventurado aquele servo que quando vier o seu senhor, encontrar fazendo assim” (Mt 24,46). 

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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