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Transfigurar Deus dentro de nós e no mundo

Marcelo Barros

                                        

O texto evangélico proposto para este 2º Domingo da Quaresma é conhecido como o relato da Transfiguração de Jesus. Neste ano C, lemos esta narrativa em Lucas 9, 28 a 36. E a primeira observação que fazemos é que, em nenhum momento, Lucas usa a palavra transfiguração. Como escrevia para o mundo de cultura greco-romana, o evangelho quis evitar confusão que levasse a compreender a fé de forma espiritualizada. Ao contrário, Lucas quer centrar a atenção na humanidade de Jesus. E por isso, ressalta que é o rosto de Jesus que se transforma e, então, suas vestes se tornam resplandecentes. E o evangelho diz que isso acontece justamente quando na montanha Jesus está em oração.

Em várias tradições espirituais, principalmente na simbologia oriental, a montanha representa também a conquista maior do ser humano sobre si mesmo, a elevação da própria consciência. Na Bíblia, desde as cenas de manifestação divina no Sinai, a montanha é o local por excelência da aliança entre Deus, a humanidade e o universo (a natureza). É na montanha que Deus diz o seu nome, portanto, revela a sua intimidade. Naquela montanha, Jesus aparece cercado de dois personagens da primeira aliança e  assume sua missão profética de cumprir o seu Êxodo, sua Páscoa, isto é, sua morte, em Jerusalém. De fato, o evangelho insiste que isso ocorre oito dias depois que Jesus tinha anunciado aos discípulos e discípulas que estava assumindo a cruz e tudo o que isso comportava. Os discípulos que estavam habituados a sempre ver Jesus em sua cotidianidade, o veem agora sob um novo ângulo, de um modo novo. Eles têm dificuldade de compreender como Jesus pode cumprir uma missão salvadora se se deixar prender, torturar e ser morto. E é neste momento que eles podem contemplar a glória do Pai presente na figura sofrida que Jesus representa. O centro da passagem é a voz que vem da nuvem, declarando Jesus como Filho amado do  Pai. Seria como se aquela pergunta que Jesus fez aos discípulos “Quem sou eu?”, o próprio Deus também tivesse querido responder: “Este é meu Filho bem-amado. Escutem o que ele diz”. É assim se dispondo à marginalidade e ao absurdo da cruz que Jesus se revela o Messias de Deus.

Neste momento, a nuvem revela que todo o universo e a natureza se reveste da presença divina. No Sinai, o monte fumegava e tremia. Agora, há uma nuvem que de um lado esconde e do outro revela a presença divina. Deus revela Jesus profeta e caminhando para a Cruz como seu filho amado e Jesus revela para nós quem é Deus. Não um Deus do poder, da ordem, do império, mas o Deus da aliança de libertação e da vida.

O Deus de Jesus não pede nem quer ofertas. Ele se oferece como dom, como oferta a nós para que a humanidade possa ser feliz e viver sua missão de cuidadora da Terra e do mundo.

Este evangelho da oração e da intimidade de Jesus com os três discípulos e com o Pai de amor nos convida a acreditar não somente que Deus revestiu Jesus crucificado da sua presença divina, mas que, em Jesus, ele, Deus, nos revela como ele é. Não somente Jesus com o seu rosto luminoso se parece divino, mas Deus aceita se parecer com Jesus e sofrer com ele e conosco nossas cruzes de cada dia na missão para transformar este mundo.  

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Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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